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quinta-feira, 31 de maio de 2012

ARTIGO - Porque Boicotar o SINAES

repasso artigo que eu fiz em 2005
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Porque Boicotar o SINAES

Wladimir Jansen Ferreira “Tristão”*

Segundo o IPEA, órgão do governo federal, o Brasil tem hoje 20% da população economicamente ativa desempregada, cerca de 40% dos jovens estão sem empregos. Verificamos que 56,9 milhões de brasileiros vivem abaixo da linha de pobreza, muitos sem direito a estudar, pois somente cerca de 5% (3,9 milhões de pessoas) estão matriculadas nos estabelecimento de ensino superior.
Desta pequena quantia, cerca de 80% estudam em universidades particulares que aceleram a exclusão das pessoas que não podem pagar as altas mensalidades. Além de o governo Lula ter pago entre janeiro de 2003 e setembro de 2004 cerca de R$ 228 bilhões de juros das dívidas interna e externa, não há uma prioridade no financiamento das universidades públicas. Aplicou nas universidades públicas no ano de 2004 somente R$ 695 milhões contra R$ 2,4 bilhões nas particulares. (Revista PUC-Viva, n° 21).
O governo tem feito suas escolhas distanciando, destruindo o ensino público e gratuito e estimulando a mercantilização do ensino. Duas velhas máximas “verba pública apenas para escola pública” e “educação gratuita para todos”, estão sendo jogadas no lixo.
A primeira medida da Contra-Reforma Universitária do governo Lula foi a promulgação do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (SINAES - Lei 10.861/04), que é uma cópia retorcida do PROVÃO de Fernando Henrique Cardoso.
O PROVÃO (Lei nº 9.131/95) foi aprovado pelo Congresso Nacional no ano de 1995 e propunha entre tantos aspectos polêmicos, o ranqueamento dos cursos em 5 níveis de desempenho. Incentivava-se a competitividade da economia de mercado na educação superior, premiando-se os melhores e punindo-se os piores. Nesta possibilidade, muitas universidades fizeram verdadeiros absurdos nos cursos, inventando Disciplinas voltadas às questões da avaliação do mesmo jeito que muitas escolas do Ensino Médio se subordinam aos Cursinhos Pré-Vestibulares (onde a maioria aplica o conhecimento de maneira descartável e comercial).
Uma avaliação de verdade é necessária e para isso no ano de 2003 houve a possibilidade da construção de uma. O MEC chegou a criar uma comissão para discutir e elaborar uma proposta de avaliação institucional. A proposta foi discutida e consolidada no II Seminário de Avaliação Institucional, ocorrido em setembro de 2003 na UFPE, organizado pelas Executivas e Federações de Curso e pela UNE, mas foi totalmente negada pelo Ministério da Educação do Governo Lula.
O SINAES não avalia somente estudantes, mas as instituições e cursos. Este sistema é subordinado à Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (CONAES), estando majoritariamente ligado ao governo e dependente do aval do presidente (1 INEP, 1 CAPES, 3 MEC, 1 UNE, 1 FASUBRA, 1 membro do corpo docente e 5 indicados pelo Ministério da Educação). Todo o Anteprojeto é permeado pela falsa idéia de democracia ao prever ampla participação da chamada “sociedade civil”. Seguindo a linha de promover “pactos sociais”, esta Comissão participará das decisões das Universidades.
A avaliação das instituições (“Auto-Avaliação Institucional”) e a avaliação dos cursos (“Avaliação Institucional Externa”) são muito superficiais. Uma Comissão Própria de Avaliação (CPA) é quem as realiza, possuindo integrantes das IES avaliadas e também da “sociedade civil organizada”, uma grande retórica, possuindo empresários como maioria na sua constituição. A confiabilidade nestas avaliações diminui verificando que os REItores terão um papel decisivo na construção destas específicas avaliações.
As instituições e cursos serão “bem avaliados” principalmente por sua “Responsabilidade Social”, que está atrelada à sua inclusão com a iniciativa privada; com cursos de Ensino à Distância; programas de voluntariado (“projeto Analfabetismo Zero”, etc); existência de empresas-juniores; currículos e profissionais voltados ao mercado; a oferta de programas de pós-graduação; a produção e divulgação científica; as instalações de laboratórios; as instalações físicas; o plano de cargos e salários; o acervo bibliográfico, entre outros. Ou seja, haverá uma coerção nas universidades para que se adaptem às prioridades do governo e do mercado, com os currículos sendo subsumidos a esta lógica.
O “Exame Nacional de Avaliação de Desempenho de Estudantes” (ENADE) será realizado para estudantes do primeiro e último ano do curso de graduação neste ano. O conteúdo da prova incluirá 30% de conhecimentos gerais e 70% do conhecimento específico do curso.
Infelizmente o ENADE terá a lógica de premiação “aos estudantes de melhor desempenho” com o Ministério da Educação concedendo “bolsa de estudos ou auxílio específico” (Art. 5º, § 10º). É também punitiva por ser obrigatória ao estudante (Art. 5º, § 3º), suspendendo e criando empecilhos na retirada do diploma aos estudantes que não vão ao dia da avaliação (Art. 10º, § 2º).
Os problemas desta avaliação aparecem quando é verificado que proporcionará uma classificação em 5 níveis de desempenho (Art. 5º, § 8º e 9°) permitindo o ranqueamento das universidades. Este ranqueamento serve para as instituições privadas propagandearem seus resultados de forma mercadológica.
Ao invés do Estado-Nacional estar auxiliando os cursos insatisfatórios, liberando recursos para sua melhora, estará auxiliando na privatização das instituições universitárias públicas. Além da segunda versão do AnteProjeto de Reforma Universitária dizer que apenas os cursos de graduação e pós (stricto-senso) poderão ser gratuitos, abster-se-á e pressionará os Reitores das Universidades Públicas para que se virem na complementação das verbas, através de prestação de serviços pagos, cobrança de taxas escolares, cobranças de cursos de pós-graduação lato-sensu e “MBA”, etc.
Muitas ações coercitivas do Estado surgirão com o SINAES que é um elemento constituinte da Contra-Reforma Universitária do governo Lula, estando presente diversas citações no AnteProjeto de Reforma Universitária. O “Capítulo II e Artigos 35 a 46” (especialmente o artigo 42) significam que as verbas serão condicionadas à classificação do SINAES, sob a retórica de “diminuir desigualdades”. Há uma clara vinculação de recursos e funcionamento do ensino superior a esta enfadonha e genérica avaliação.
O ranqueamento dos estabelecimentos de ensino superior estará subordinado na fragmentação do Ensino Superior em 3 subdivisões: “Universidade, Centro Universitário e Faculdade”, presente no “Capítulo II, Seção I, artigo 15, Título I”.
A instituição do Centro Universitário (público ou privado) significa um retrocesso na educação brasileira. É uma espécie Universidade de segunda categoria, que pode ter um porcentual mais baixo de docentes qualificados com títulos de mestrado ou doutorado (apenas um terço), podendo empregar apenas um quinto do corpo docente em regime de dedicação exclusiva ou tempo integral. Poderá ter um ciclo inicial de formação com duração mínima de dois anos, após o qual o estudante receberá um titulo próprio, sem valor de habilitação. Além de ser uma versão do “ciclo básico” é um passo para a introdução do princípio do “módulo” recomendado pelo Banco Mundial, que depois viraria um diploma de segunda categoria. Pode ser o começo do fim do Diploma Nacional, como já estão fazendo em outros países. O Anteprojeto também garante a continuidade da existência de cursos seqüenciais em programas de formação continuada.
A intenção do governo federal e dos tubarões do ensino superior é impor um modelo único (padronizado) para cada curso, adequando às necessidades do mercado de trabalho. Há uma nítida tentativa de uniformizar o conhecimento e buscar tornar igual o que é diferente com esta pseudo-avaliação, que, além de não apontar deficiências das instituições, cursos ou alunos, está mais interessado com a concorrência monopolista.
Esta dita avaliação possui um caráter classificatório, punitivo e superficial, não se identificando os pontos falhos para serem trabalhados. Não avalia todo o processo de ensino\aprendizagem, ao contrário, contextualiza-se apenas o momento presente negando a devida atenção sistemática aos conteúdos apreendidos de forma gradativa, perdendo o critério verdadeiramente avaliativo. Não acredito que exista uma concepção pedagógica na concepção e na avaliação desta.
É necessário um sistema de avaliação para o ensino superior, desde que contribua pra a melhoria das instituições no sentido de universalizar as vagas nas instituições públicas com qualidade. Por enquanto não temos a avaliação buscada, por isso devemos boicotar o ENADE e pedir a revogação do SINAES.

Wladimir Jansen Ferreira “Tristão” é estudante de geografia da PUC-SP e membro da direção da Associação dos Geográfos do Brasil - Regional SP (AGB-SP).

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