OS TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM E O FUNCIONAMENTO DO CÉREBRO
Wladimir Jansen Ferreira
O conhecimento sobre a saúde mental dos alunos
por parte dos educadores é muito importante para que seus alunos tenham um bom
desempenho no aprendizado escolar e para se reverter alguns quadros (ou alguns
sintomas, dependendo do transtorno). Tendo um conhecimento sobre a saúde mental
dos alunos, o professor estará melhor capacitado e poderá melhor escolher os
métodos de ensino-aprendizagem mais apropriadas e mais eficazes para a
dificuldade específica deste aluno.
O CÉREBRO
HUMANO e a EDUCAÇÃO
As
duas imagens que se seguem mostram os “lobos cerebrais”:
FIGURA
2: Lobos Cerebrais[2]
O
cérebro humano pesa cerca de 1,5Kg e ocupa menos de 20% do corpo humano e tendo
100 bilhões de neurônios. Não existe um cérebro igual à outro, pois são
diferentes no tamanho, na organização e estruturas cerebrais e nas
características das conexões cerebrais. Existem 4 lobos cerebrais (Temporal,
Ociptal, Parietal e Frontal) e 2 Hemisférios cerebrais (o Direito – responsável
pelas habilidades espaciais e reconhecimento de imagens – e o Esquerdo – que controla
as redes neurais da linguagem, matemática e lógica).
O
Lobo Frontal é responsável pelo planejamento e ação, julgamento e memória,
sendo o último a ser formado pelo ser humano. O Lobo Temporal é responsável
pela audição, memória e reconhecimento de objetos. O Lobo Parietal é
responsável pela sensação e processamento espacial. O Lobo Ociptal é
responsável pela visão. A “Área de Broca” é responsável pelo processamento e
compreensão da fala. A “Área de Wernicke” (que fica entre os Lobos Temporal e
Parietal) é responsável pelo reconhecimento da fala. O “Córtex Visual Primário”
(localizado acima do cerebelo e dentro do Lobo Ociptal) é responsável pela
discriminação e movimento de cores. O cérebro ainda tem o Cerebelo, o Sulco
Central e o Sulco Lateral.
A
compreensão do desenvolvimento do cérebro dos seres humanos é essencial para
que o educador perceba, por exemplo, que a instabilidade comportamental dos
jovens se dá pelo fato do córtex pré-frontal estar em desenvolvimento. Outro
exemplo, é que os desenvolvimentos das habilidades mentais estão mais presentes
em faixas etárias específicas (principalmente na infância e na puberdade),
podendo ser, principalmente, nos “períodos sensíveis”.
Com
acompanhamento e compreensão do funcionamento do cérebro dos alunos, o
professor poderá realizar um trabalho mais eficaz na superação das dificuldades
apresentadas pelos alunos e estes poderão ter uma aprendizagem significativa.
PLASTICIDADE
CEREBRAL e a EDUCAÇÃO
Plasticidade
cerebral é a capacidade do cérebro de se moldar e se modificar em sua estrutura
ao longo do tempo, sendo esta capacidade inerente ao ser humano, podendo estar
presente à todos (principalmente naqueles que sofreram acidentes motores), em
qualquer faixa etária, em todos os momento da vida de um indivíduo e se
realizando de maneira diferenciada com as pessoas.
Existem
dois tipos de plasticidade cerebral: a “experiência expectante” (sendo uma
tendência genética ás modificações estruturais do cérebro do início da vida à
velhice) e a “experiência dependente” (onde as modificações estruturais do
cérebro ocorrem pelas experiências vivenciadas ao longo da vida deste ser
humano). Portanto, a plasticidade cerebral ocorrerá com qualquer ser humano,
mas de maneira diferenciada.
A
plasticidade cerebral ocorrerá a partir do momento do cérebro ser estimulado de
maneira diferenciada, fazendo este se reprogramar e criar novos caminhos entre
os neurônios, sendo que, quando mais jovem, o cérebro será mais suscetível e
maleável à mudanças estruturais.
Os
educadores poderiam se aproveitar deste fato para superar dificuldades de
aprendizagem dos alunos, pois as crianças podem ser estimuladas para sua
mudança de comportamento, fazendo o seu cérebro se reorganizar, tendo novos
aprendizados, novas memorizações e novas adaptações. Para esta ação é necessário
de laudos médicos e acompanhamentos médicos especializados, integrando a
família com a escola. Esta ação é primordial para se superar dificuldades de
aprendizagem dos alunos (ou mesmo problemas disciplinares, etc) e se atingir
uma aprendizagem significativa por parte dos educandos.
OS TRANSTORNOS de APRENDIZAGEM e a EDUCAÇÃO
Importante diferenciar “transtornos (ou
distúrbios) de aprendizagem”, de “dificuldade ou problema de aprendizagem” e de
“deficiência intelectual”.
As dificuldades de aprendizagem são desordens na
aprendizagem de maneira geral, sendo fatores removíveis e não necessariamente de
causa orgânica[3].
Deficiência intelectual não é dificuldade de
aprendizagem, é biológico e o indivíduo pode avançar em ritmo diferenciado.
Os “transtornos de aprendizagem” existem por uma
disfunção do sistema nervoso central, sendo um grupo heterogêneo de alterações
manifestas por dificuldades significativas na aquisição e uso da fala, escrita,
raciocínio e habilidades matemáticas[4]. Este
não desaparecerá, mas se ocorrer um diagnóstico precoce e um tratamento
adequado, o indivíduo com estes transtornos poderão melhorar seu desempenho
escolar.
Existem vários “transtornos de aprendizagem”,
listarei os principais:
Transtorno
Desafiador Opositivo, inicia-se com cerca de 6 anos de
idade, sendo de origem biológica e ambiental. O aluno está com frequente impaciência
com os adultos, desafiador e se opondo a regras ou solicitações, desafiando a
autoridade dos professores, sendo impulsivo e manipulador, enraivecido quando
contrariado e brigando constantemente, implica com as pessoas
responsabilizando-as pelos seus erros, estando sempre enraivecido (além de
irritado, ressentido, rancoroso e com ideias de vingança). O aluno possui baixa
auto-estima, fraca tolerância à frustrações, humor deprimido, ataques de raiva,
tendo poucos amigos, sendo rejeitado por colegas e querendo resolver sozinho os
seus problemas. Se não tratado, poderá evoluir para o Transtorno de Conduta.
Transtorno
de Conduta ocorre mais em meninos de 10 a 12 anos e nas
meninas de 14 a 16 anos de idade, sendo de origem genética e ambiental. O aluno
constantemente viola regras, possuindo comportamento anti-social, agredindo
pessoas e animais, usando armas em brigas, não tendo culpa ou arrependimento no
que faz, sendo desafiadores e hostis, destruindo patrimônio alheio, fugindo de
casa, consumindo álcool e outros tipos de drogas, tendo comportamento sexual de
risco, com dificuldade de respeitar regras, tendo sadismo, executando bullying
nos colegas de escola. O diagnóstico cedo é essencial para a reintegração e
adaptação do convívio do jovem na sociedade. É necessário que haja intervenções
da família com medidas sócio-educativas, treinamento das habilidades sociais e de
técnicas cognitivo-comportamentais e tratamento médico especializado em saúde
mental.
O
Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é uma síndrome
neurológica (pelas alterações do córtex pré-frontal e estruturas subcortiais do
cérebro) mais comum nas crianças de 0 a 7 anos de idade e o fator genético é o
mais provável. O aluno “não para quieto” e se remexe na cadeira (pula e grita),
não presta atenção nas aulas, possui dificuldades de aprendizagem, não possui
concentração, é hiperativo, é elétrico e com excesso de energia, distraindo-se
facilmente e com dificuldade em se focar em um único objeto. Geralmente este
aluno não termina deveres, possui dificuldades em se organizar, perde materiais
escolares, é atrasado, não brincando em silencio, possui insônia e é
estressado. Se não tratados, podem se tornar adultos inseguros, poucos
habilidosos socialmente e com menos anos na educação escolar. O tratamento deve
ocorrer pela ação multidisciplinar, com medicamentos e com medidas da escola
(fazendo este se sentar perto da lousa e longe das janelas, criando rotina de
estudos, horários pré-determinados e combinados, pausas regulares no estudo,
ambiente de estudo silencioso, etc).
A
Depressão Infantil ocorre principalmente em adolescentes, tendo causas
genéticas, fatores bio-químicos, hormonais e ambientais. O aluno demonstra
apatia, tristeza, isolamento, queda nas notas, fala tênue e fraca,
desesperança, ideia de suicídio, desmotivado, solitário, com explosões de
raiva, com humor deprimido-instável-irritável, algumas brigas na escola, etc. Este
possui baixa serotonina e norodrenalina na fenda sináptica (áreas de
comunicação entre células nervosas) e deve ser tratado com medicamento,
tratamento psicoterápico, psicoeducação e trabalho cognitivo.
O
Autismo Infantil é um transtorno do espectro autista, tendo fatores
genéticos, de desenvolvimento do cérebro na gestação e fatores congênitos
(adquiridos com doenças como rubéola, encefalite e meningite). O aluno possui
prejuízos na interação social, tendo atraso na aquisição de linguagem, comportamento
estereotipado e repetitivo, sendo anti-social, não demonstrando emoções (não
chora, não sorri), não acompanhando objetos que os pais mostram, “escondendo-se
e se isolando do mundo” e não fala palavras. O diagnóstico precoce e o
tratamento imediato pode reverter alguns sintomas. O tratamento deve ocorrer
pela ação multidisciplinar (com médico, psicólogo, fonoaudiólogo, etc),
buscando o treinamento das habilidades sociais, medicação, brincadeiras em
grupo na escola (buscando a relação social com colegas, a correção de
comportamentos repetitivos e o acalmamento do estudante em situações de
irritabilidade-impulsividade).
O
Transtorno Ansioso é de causa genética e ambiental (pela ansiedade
paterna, relação com pais, estilo da criação, morte de parentes, situações
ansiogênicas na TV, etc). o aluno possui desconforto, inquietação, ansiedade e
sintomas somáticos (sudorese, boca-seca, taquicardia, nervosismo, etc). o
tratamento deve passar pela terapia cognitiva e corporal, pelo
auto-reconhecimento (dos sintomas, sentimentos, pensamentos e reações do
organismo) e medicação.
O
Transtorno de Ansiedade de Separação ocorre mais em crianças de até 7
anos de idade. O aluno possui uma ansiedade exasperada de separação familiar,
não dormindo sozinho, não participando de atividades extra-escolares, não
dormem em casa de colegas, com dores de cabeça e estomacais, prejuízos acadêmicos,
dificuldade de relacionamento, círculo restrito de amigos, baixa auto-estima,
falta e atrasos escolares. O tratamento pode se dar com atividades fora da sala
de aula e em outros espaços escolares, com contação de histórias sobre o
assunto, relato de colegas, permanência da família na escola por um pequeno período,
por contratos com a criança, etc.
A
Esquizofrenia de Início Precoce ocorre antes dos 18 anos de idade,
possuindo origem neurobiológica e alterações químicas de origem genética, além
de fatores ambientais (estresse, violência doméstica-física-emocional, negligência
e pobreza extrema). Os alunos possuem prejuízos na cognição e afeto, prejuízos nas
relações interpressoais, prejuízos no desempenho acadêmico, alucinações,
delírios, embotamento afetivo, empobrecimento da fala, desorganização do
pensamento, isolamento social, “não olha nos olhos” e descuido com higiene
pessoal. O tratamento deve ocorrer com psicoterapia familiar e cognitiva, com
técnicas para resolver problemas e tratamento de habilidades sociais e
medicação.
A
Dislexia pode surgir no início da alfabetização da criança. O aluno tem
dificuldade em prestar atenção nas aulas, dificuldade em ler e escrever
(leitura lenta e monossilábica, com pouca entonação de voz, sem interpretação,
prejudicando o significado), desempenho fraco em português e inglês, leitura
vagarosa (abaixo do esperado para a idade), dificuldades de entender enunciado
nas provas e de elaborar ou compreender textos, não associa letra ao som,
possui processo lento, dificuldade na construção de frase, etc. O tratamento
deve ocorrer com profissionais de deficiências visuais-auditivos,
fonoaudiólogos e com trabalho psicoeducacional.
PAPEL do PROFESSOR FRENTE aos TRANSTORNOS de APRENDIZAGEM
Os ideais
da política de “inclusão” de alunos com necessidades especiais estão presentes
na Conferência de Salamanca[5],
que foi organizada pela UNESCO e o Ministério
da Educação e Ciência de Espanha (além
de 88 governos e 25 organizações
internacionais) no ano de 1994.
O papel do professor não é fazer diagnóstico,
cabendo um profissional de saúde mental o fazer, pois isto despende anos de
observação e estudo médico. Isto reforça a importância da articulação da
família com a escola e a necessidade do acompanhamento médico em saúde mental
das crianças.
Cabe ao professor e aos educadores buscarem a
aprendizagem dos alunos na sua disciplina, à inclusão dos alunos e respeito à
diversidade, à socialização e sentimentos de cooperação entre alunos. Estes devem
diagnosticar quais os motivos da não-aprendizagem dos alunos. Os educadores
podem traçar quadros da saúde mental e comportamento de cada aluno, que deverá
ser encaminhado à coordenação pedagógica em forma de relatório e aos
pais/responsáveis destes alunos em momentos específicos (reuniões, etc).
O
professor poderá intervir positivamente para a superação de alguns sintomas de
transtornos de aprendizagem, tendo em vista que deve atuar conjuntamente com familiares,
com outros colegas na escola e profissionais da saúde mental.
É
necessário que haja plasticidade aos profissionais de ensino na realização dos
seus planos de ensino, ou seja, estes devem realizar modificações em seus
planos de ensino com vias de incluir os alunos com necessidades especiais e com
Transtorno de Aprendizagem. A realidade é diversa e os seres humanos são
heterogêneos, buscando o atendimento não preconceituoso à estes alunos com o
tratamento diferenciado, mas inclusivo.
O
professor deve adaptar o currículo e seus planos de aulas ao contexto social
com vista a qualidade para todos, ou seja, deve estar preparado para a
heterogeneidade dos alunos e para o trabalho com alunos com necessidades
especiais e com Transtorno de Aprendizagem.
Muitas
vezes o professor e a escola não possuem o laudo deste aluno, sendo que estes
transtornos se tornam evidentes durante o percurso, ou seja, durante o ano
letivo. O professor e a escola não são obrigados a realizar o laudo médico de
transtorno de aprendizagem, mas pode participar diagnosticando alguns dos
comportamentos destes alunos, convocando seus pais e encaminhando para
atendimento médico especializado. Em um segundo momento, a escola deve caminhar
conjuntamente com a família e os profissionais médicos especializados.
Quando
diagnosticado o transtornos de aprendizagem no aluno, o professor deve adaptar
o seu currículo e plano de aulas para um trabalho diferenciado e adaptado às
dificuldades deste aluno.
O
professor poderá realizar atividades que desenvolva as habilidades sociais,
técnicas cognitivas, trabalhos e brincadeiras em grupo (para desenvolver
relações sociais com colegas, corrigir comportamentos repetitivos e acalmando
estudante em situações de irritabilidade e impulsividade), colocar alunos longe
das janelas e próximos da lousa (em caso de TDAH), desenvolver rotina de
estudos nos alunos, traçar horários predeterminados e combinados com crianças,
pausas regulares no estudo, ambiente silencioso e diminuição de estímulos
visuais (caso de TDAH), etc.
A
escola pública como instituição pública, que deve atender os preceitos da
democracia participativa e inclusiva, deve garantir um ensino de qualidade para
todos os alunos, independentemente de sua classe social, etnia, religião e
transtorno de aprendizagem. Com os alunos com transtornos de aprendizagem. A
escola deve ser ainda mais inclusiva e preocupada em não diferenciar
discriminatoriamente estes alunos, auxiliando em realizar diagnósticos,
convocando pais e responsáveis deste, encaminhando para o atendimento médico
especializado, além de fazer o acompanhamento conjunto em parceria com a
família e os profissionais médicos especializados para a superação de alguns
sintomas dos transtornos de aprendizagem ou a sua radical extinção (em alguns
casos).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COLLARES, C. A. L. e MOYSÉS, M. A. A. A História não
Contada dos Distúrbios de Aprendizagem. Cadernos CEDES no28, Campinas: Papirus, 1992, pp.31-48.
GUZZO, Raquel Souza Lobo. Saúde psicológica, sucesso escolar e eficácia da escola: desafios do
novo milênio para a psicologia escolar. In: DEL PRETTE, Z. A.
P. (Org). Psicologia Escolar e Educacional: Saúde e Qualidade de
vida. Campinas: Alínea,
2001.
UNESCO & MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA DE
ESPANHA. Declaração de
Salamanca - Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das Necessidades
Educativas Especiais, UNESCO, 1994.
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