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sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Atividades do Filme "Kirikou e a Feiticeira"

repasso atividades do Filme "Kirikou e a Feiticeira".
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Além de responder estas 11 questões, o professor pode pedir para os alunos fazerem um mapa do filme (ressaltando a territorialidade dos lugares):

O professor pode encaminhar o debate do filme falando sobre cooperação, cidadania, conhecimento e preconceito.
Importante perceber que a feiticeira Karabá exerce um papel que poderia ser comparado ao dos "governos burgueses" em uma sociedade capitalista, pois concentra riquezas (ouro dos moradores da aldeia de Kirikou), explora o trabalho da população (moradores da aldeia de Kirikou), faz um papel de policial e repressão contra os oprimidos (moradores da aldeia de Kirikou).
O avô de Kirikou, que morava na "Montanha Proibida" é a representação da sabedoria e do conhecimento. A Karabá oprime os moradores da aldeia de Kirikou, impossibilitando deles terem acesso ao Sábio/Conhecimento. Os moradores da aldeia de Kirikou só terão acesso ao Sábio/Conhecimento depois que Kirikou consegue descobrir o problema de Karabá e de ajudá-la, não sendo à toa que o Sábio retornará à aldeia quando tudo já estava resolvido no final do filme.
Kirikou pode ser considerado uma pessoa sábia e preocupada com a coletividade (sua aldeia), lutando firmemente pelos direitos de cidadania de toda comunidade oprimida.
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1) Kiriku a todo momento quer saber:
a) Como destruir Karabá
b) Porque Karabá é malvada
c) Onde está o ouro que Karabá roubou da aldeia
d) Ficar rico

2) Porque que Karabá não quer que ninguém vá ao Mago da Montanha?
a) Porque ele é mais poderoso que ela
b) Porque ele ilude as pessoas
c) Porque ele diz a verdade
d) Desilusão amorosa

3) O Grande Cupinzeiro é a porta de entrada da Montanha Proibida. Para quem ela se abre?
a) Para quem for digno
b) Para quem disser palavras mágicas
c) Somente para Karabá
d) Pro povo da aldeia

4) O Sábio diz que Kiriku só pode enfrentar Karabá:
a) Com um talismã
b) Quando crescer
c) Com armas
d) Com inteligência

5) O velho Contador de Histórias da aldeia é:
a) Medroso
b) Sábio
c) Corajoso
d) Inteligente

6) O Sábio diz a Kirikú que Karabá é malvada:
a) Porque só pensa em ouro
b) Porque está sofrendo
c) Pelo prazer da maldade
d) Por egoísmo

7) Quantas vezes Kiriku salva as crianças?
a) 3 vezes
b) 2 vezes
c) 1 vez
d) Nenhuma vez

8) Kiriku vai até a Montanha Proibida:
a) Com a ajuda do Tio
b) Com a ajuda das crianças
c) Com a ajuda da Mãe
d) Com a ajuda dos animais

9) As pessoas tinham preconceito com Kiriku no começo do filme?

10) O que Kiriku teve de fazer para vencer a feiticeira Karabá?


11) Kiriku se preocupa com as pessoas da comunidade dele? O que isso tem a ver com CIDADANIA?

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

"Um fim de semana no parque", 20 anos depois

18/10/2013 4:52 pm
Um fim de semana no parque, 20 anos depois
Duas décadas depois de a música dos Racionais se tornar o hino de parte da zona sul de São Paulo, Fórum conta o que mudou (ou não) na rotina de uma das regiões mais pobres e violentas da capital 
Por Pedro Venceslau e Regiane de Oliveira
A matéria abaixo faz parte da edição 119 de Fórum, compre aqui.
Mil novecentos e noventa e três. Decididos a mostrar um país que não cabia nas estatísticas do governo, os Racionais MC’s lançam o LP Raio X do Brasil, um manifesto que tirou a periferia da margem para ser destaque nas rádios das grandes cidades. Usando e abusando da liberdade de expressão, os rappers< Mano Brown e Edy Rock entraram “no mundo da informação, autoconhecimento, denúncia e diversão” em meio às desigualdades sociais da maior capital do País. É de um dia típico de verão em São Paulo, janeiro, zona sul, que nasce a música “Fim de semana no parque”, um hino sobre a dicotomia entre os bolsões da classe média e as ruas de terra dos bairros pobres da cidade.

(Guilherme Perez)
Vinte anos depois, o cenário não é mais o mesmo. A economia não é mais a mesma. Fórum foi passar um fim de semana na região que ficou conhecida como Triângulo da Morte – Parque Santo Antônio, Jardim Ângela e Capão Redondo – e mostra que a periferia de São Paulo evoluiu pouco para tornar a música dos Racionais obsoleta. Aliás, a letra nunca foi tão atual. As estatísticas não são mais tão alarmistas a ponto de chamar a atenção internacional, como na década de 1990, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) classificou a região como o local mais violento do mundo, com uma média de duas mortes ao dia. Mas esses bairros continuam com posição de destaque nos índices de maior número de homicídios da cidade. Em 2011, a cada 100 mil habitantes, 15,62 foram assassinados na região do M’Boi Mirim. O número absoluto é de 89 homicídios. Parelheiros, Campo Limpo, Cidade Ademar e Capela do Socorro também ajudam a engordar as estatísticas dos bairros mais violentos da cidade: 221 assassinatos no ano. Não muito longe dali, na área da “playboyzada”, as estatísticas são diferentes. Vila Mariana e Pinheiros, por exemplo, registraram, em todo o ano, seis assassinatos cada. É o menor número de mortes dentre todos os bairros de São Paulo.

(Guilherme Perez)
“Polícia, a morte. Polícia, socorro”
Enquanto isso, e a “molecada da área, como é que tá”? “Ninguém nega que a violência diminuiu. Mas recentemente voltamos a ter chacinas na zona sul”, lamenta o poeta Sérgio Vaz, idealizador da Cooperativa Cultural da Periferia (Cooperifa). As manchetes policiais do começo do ano não mentem. “Subiu para sete o número de mortos na chacina ocorrida na noite de sexta-feira (4/1) na região do Campo Limpo, na zona sul de São Paulo”, informa o portal G1. “DJ Lah, do Conexão do Morro, é assassinado em São Paulo (5/1). Parceiro de mixagens do rapper Mano Brown, tinha 33 anos e deixa quatro filhos, amigos e família inconformados com tamanha covardia”, completa o SPressoSP. Morto por quem? Culpa de quem? Motivo? “A vizinhança suspeita que o crime foi praticado por policiais militares ligados a grupos de extermínio”, lembra o site do Estadão. “Grávida é baleada na cabeça em tentativa de assalto em Campo Limpo”, estampa o Agora São Paulo.
Grupos de extermínios aterrorizaram São Paulo no ano passado. A cidade teve ao menos oito chacinas, em 2012, atribuídas a policiais em luta contra o crime organizado. A cidade perdeu 94 policiais, um salto em relação ao ano anterior: 56 mortes. O número levou à exoneração do secretário de Segurança Pública do governo de Geraldo Alckmin, Antonio Ferreira Pinto – o mesmo que insistia em dizer que a situação estava sob controle.
Muller Silva nasceu no mesmo ano em que a música “Fim de semana no parque” explodiu nas rádios e tornou-se o hino da zona sul de São Paulo. Hoje, aos 20 anos, ele diz que lembra a letra inteira, mas só se alguém começar a cantar. “Gosto de rap, mas ouço mais folk e rockalternativo.” Nascido e criado na Z/S, como os moradores costumam chamar a zona sul, ele perdeu um irmão de forma trágica em 2011. “O Alex era envolvido com o tráfico e morreu com 19 anos, depois de levar dois tiros na cabeça durante uma perseguição.”
Apesar da pouca idade e da cara de menino, Muller é bem articulado. Chegou a começar a faculdade de designgráfico, mas desistiu por falta de dinheiro, e ocupa hoje o cargo de monitor da Associação Educacional e Assistencial Casa do Zezinho, ou simplesmente Casa do Zezinho. “Talvez a nossa história seja uma sina. Eu e meu irmão tivemos as mesmas oportunidades, mas ele vivia na rua e se envolveu com más companhias, enquanto eu fui para a escola.” Para Muller, a letra de “Fim de semana no parque” continua atual e poderia ter sido feita hoje. A relação da comunidade com a PM cantada no refrão de Mano Brown em 1993 (“Tem um corpo no escadão e a tiazinha sobe o morro. Polícia, a morte. Polícia, socorro”) não melhorou nas últimas duas décadas. “Eu não confio na polícia”, diz o monitor. Ele revela que a recente onda de assassinatos de policiais que abalou as estruturas do governo paulista deixou o clima pesado. “Aqui existe um toque de recolher, que não se sabe ao certo de onde veio. Mas essa briga entre a polícia e os bandidos está causando muita morte na região. Estão todos sendo cautelosos.”
Fundada em 1994, um ano depois do lançamento da música dos Racionais, a Casa do Zezinho procura manter uma relação cordial com o tráfico. Parte das 1,5 mil crianças e adolescentes atendidos pela instituição tem pais que estão ou estiveram envolvidos com o crime. “Tinha milícia aqui antigamente. Eles eram chamados de ‘pés de pato’. Nos anos 1990, marcavam as pessoas que estavam no tráfico para matarem. A Casa do Zezinho refugiou alguns deles”, conta Muller Silva, ressaltando que a organização não identifica quem é filho de traficante. Psicóloga e diretora da Casa do Zezinho, Ana Beatriz Nogueira, a Tia Bia, chama o tráfico de “quarto setor”. “Não posso entrar em detalhes, mas a nossa relação com o tráfico é de respeito.”

(Guilherme Perez)
Entre os “zezinhos” – como são chamados os alunos da instituição – os Racionais são considerados ídolos. A banda frequenta o lugar e chegou a fazer uma música para os meninos. “O rapé um veículo direto de identificação”, conta Tia Bia. Muitas vezes, a mágoa dos moradores da periferia com a polícia vem de longe de casa e começa nos bairros nobres. “Prefiro evitar a polícia. Quando eu ia nas baladas da Vila Madalena, a abordagem era sempre agressiva. A gente não tinha grana para entrar nas baladas, então comprávamos nossas bebidas. A polícia chegava e quebrava nossas garrafas”, relata o educador Adriano de Oliveira, 27, morador de Vila das Belezas.
“Estou a uma hora da minha quebrada”
Foram necessárias duas décadas de governo do PSDB para que a “quebrada” dos Racionais ficasse mais perto do centro. Demorou, mas, em 2002, o metrô da linha Lilás, que liga Santo Amaro ao Capão Redondo, deu mobilidade aos 563 mil habitantes da região da subprefeitura do M’Boi Mirim. No Capão Redondo, a chegada do trem que cruza a zona sul, com destino a Osasco, também melhorou o acesso da população da Capela do Socorro e Parelheiros ao centro. Outras vias de acesso, como os corredores de ônibus, feitos durante o governo Marta Suplicy, diminuíram o tempo de acesso à zona sul.
Houve também algum progresso em termos de emprego e renda na região. A zona sul perdeu, em 2010, o posto de “número um em baixa renda da cidade”, com R$ 1,00 a mais em relação à parca renda média de R$ 1.063, dos distritos do extremo leste da capital, como São Miguel Paulista. Os trabalhadores da zona sul tiveram uma renda média de R$ 1.064 – mesmo assim, menos da metade de moradores de bairros ricos como Butantã, Lapa e Pinheiros, onde a renda média foi de R$ 2.773. Esses dados colocam os trabalhadores da zona sul no limiar da Classe C, que, segundo a Secretaria de Assuntos Estratégicos do governo federal, tem renda familiar entre R$ 1.540 e R$ 2.313.
As taxas de desemprego no público de maior risco, jovens de 16 a 29 anos, diminuiu, ajudando a inflar as estatísticas de renda. Em 2010, a região do M’Boi Mirim teve 16,32% de jovens nessa faixa etária desempregados, em linha com os resultados de outras subprefeituras da zona sul, como Parelheiros, Capela do Socorro e Cidade Ademar. Um pouco mais alta que a média da capital, de 15,09%, e bem acima da de bairros centrais, como Ipiranga, com 12,06%.

Adriano Oliveira, morador de Vila das Belezas (Guilherme Perez)
Mas o mesmo crescimento econômico que trouxe melhores condições de acesso teve seus efeitos colaterais. Com o dinheiro vêm mais carros… logo, mais trânsito. Um percurso em dia de semana nas horas de rush entre a região da avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini, no Brooklin, e a Casa do Zezinho, no Parque Santo Antônio, a apenas 11 quilômetros da região, seja de carro ou de ônibus, pode levar até duas horas.
“O centro comunitário é um fracasso”
Tia Bia, da Casa do Zezinho, cita os Racionais para falar de um dos maiores gargalos dos bairros que compõem o extenso mosaico de “quebradas” da zona sul. “Como diz a música: ‘Chegou fim de semana, todos querem diversão’. Existem poucas referências de lazer na região. O grande programa é ir ao shopping (Campo Limpo), que vive lotado”. Muller Silva lembra que existem na área dois CEUs (Centro Educacional Integrado). “Eles têm até piscina, mas é muito burocrático para usar. Às vezes a criança não tem nem RG para fazer ficha.”

Jaime “Diko”, do Espaço Comunidade (Guilherme Perez)
Os moradores ouvidos por Fórum reclamam que os centros criados foram esvaziados e, hoje, são apenas escolas com piscinas. A concepção do CEU, construído na gestão Marta Suplicy, era de que ele pudesse integrar atividades educacionais, de lazer, esporte e cultura da periferia, envolvendo a comunidade local. As gestões seguintes foram estrangulando aos poucos os orçamentos, até que ficou inviável manter as atividades. “Não temos nenhum clube da prefeitura”, finaliza Muller. O sucateamento dos aparelhos públicos da zona sul não se resume ao caso dos CEUs. No Centro Cultural Monte Azul, no bairro de mesmo nome, frequentadores contaram que o local simplesmente dá férias coletivas para os funcionários durante o recesso escolar, justamente o momento em que a demanda mais cresce. Foi lá que a reportagem conheceu o educador Adriano Oliveira, 27, de Vila das Belezas. Ele conta que alguns moradores se cotizam para manter o lugar aberto em janeiro. “É difícil encontrar uma praça e os CEUs viraram grandes escolas com piscina”, diz.
“Eu me sinto um traficante”. A sensação de Jaime “Diko” Lopes, um dos idealizadores do Espaço Comunidade, pode parecer exagerada; afinal, ele é só mais um dos milhares de donos de bares na periferia de São Paulo. Como já se tornou comum na região, utiliza os recursos do bar para financiar os eventos que acontecem no “Espaço Comunidade”, um espaço cultural independente que organiza shows de jazz, chorinho, roda de samba. A própria Cooperifa, um dos espaços mais tradicionais de cultura do Parque Santo Antônio, também funciona dentro de um bar. Mesmo assim, Diko lamenta ter de usar esse recurso. “A bebida é a primeira droga. Em cada rua da região, há uns 15, 20, 50 bares. Infelizmente, dependemos disso para sobreviver e pagar o aluguel do centro”, admite. “Não se escuta falar que alguém bateu o carro porque fumou maconha. Foi cachaça. Bateu na mulher… cachaça, não maconha.”

Sergio Vaz, da Cooperifa (Guilherme Perez)
Com 31 anos, Diko é daqueles que cresceram ouvindo os LPs dos Racionais. “O primeiro disco que ganhei do meu pai foi do Racionais. Sei o quanto a música ‘Fim de semana no parque’ ainda é atual”, acredita. Mas ele não gosta de falar de violência. “Gosto de falar de arte, de solução para os problemas da periferia por meio da arte.” Para Diko, o acesso à internet é uma das grandes revoluções sociais que está mudando a cara da periferia. Se antes os jovens da periferia tinham de ir até ao centro para ter acesso à cultura, hoje eles sabem on-line onde está acontecendo as melhores festas. Noites de jazz? Chorinho? Lançamentos? Documentários? “Tem tudo aqui. Não preciso ir para a Vila Madalena para encontrar diversão”, conta Diko. Aliás, é a turma dos bairros centrais que está buscando as atividades culturais na periferia.

Muller Silva, da Casa de Zezinho (Guilherme Perez)
O cenário cultural explodiu em 20 anos na periferia. Nenhuma outra região da cidade tem um número tão grande de saraus, por exemplo. Sarau da Cooperifa, Sarau com Elas, Vila Fundão, Sarau do Binho. As opções são diversas. “No Sarau na Cooperifa, chegamos a atrair 500 pessoas em cada quarta-feira à noite”, conta Sergio Vaz. “Na minha época, eu tinha de ir para o Bexiga achar diversão. Agora ela está aqui”, diz.
Apesar disso, Vaz não é dos mais entusiasmados com os ventos das mudanças. “Sei que parece uma amargura, mas ainda falta tanto… Aqui não tem a presença do Estado. E isso tem consequências”, lamenta. Segundo Vaz, a população tem poucas saídas para tentar escapar da violência: o crime, as bebidas e as drogas ou as igrejas. “Com sorte, uma mãe desesperada porque seu filho usa crack consegue levá-lo a uma igreja evangélica.” Assim como os bares povoam cada esquina, as igrejas evangélicas crescem oferecendo alento. “As igrejas também são um fenômeno da falta do Estado. Eu não sou religioso, mas ainda bem que elas existem.”
Em relação à atuação do poder público na área cultural, o governo instalou uma Fábrica da Cultura no Capão Redondo. O projeto utiliza dinheiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para trazer à comunidade as mais variadas formas de expressão artística. A cidade tem seis fábricas localizadas em regiões onde o Índice de Vulnerabilidade Juvenil – composto por indicadores como frequência escolar, gravidez e violência entre jovens – é alto.
“O pessoal, desde às 10 da manhã, está no samba”
Mano Brown já deve ter percebido: o samba já não é o mesmo na periferia. Todos dizem gostar de samba, é fato. Assim como todos também dizem gostar de rap. Mas o que a juventude escuta muito é funk, e muitos de “ostentação”. É uma vertente desse tipo de música que exalta os anseios de consumo da nova classe média, um som que nasceu na periferia de São Paulo e já ganha espaço em outras capitais. “As pessoas estão cansadas de ouvir música de protesto. Eles querem é cantar suas conquistas. Seja na Sul ou Leste, é ofunk que bomba”, provoca o produtor musical Renato Barreiros. Diretor do badalado documentário Funk Ostentação, ele foi subprefeito de Cidade Tiradentes, na zona leste.
“O trabalho melhorou. Há mais empregos. E os jovens têm uma demanda reprimida de consumo. Eles querem ter TV de plasma, videogame, óculos da moda. E não é qualquer par de óculos”, pondera Sergio Vaz. O Bonde da Juliet é um exemplo. Criada pelo MC Bio G3, a canção fala sobre um modelo de óculos da marca Oackley, o Juliet, que não sai por menos de R$ 1.800.
As empresas já entenderam essa nova cara da periferia. Não é difícil encontrar grandes marcas como Magazine Luiza e Casas Bahia ainda disputando o espaço das ruas com um varejo tradicional e desconhecido. Companhias de TV a cabo como NET ou SKY são achadas facilmente na região. Na construção, a realidade também mudou. Telhanorte e uma grande variedade de pequenos comércios de construção ajudam a mudar a cara das casas, anteriormente sem reboco. No comércio, supermercados como o Dia%, dos mesmos donos da rede francesa Carrefour, e Extra, do Pão de Açúcar, já garantiram seu lugar ao Sol. E na construção, empresas como MRV, Rossi e PDG. “A periferia vive um momento de consumo. Mas espero que seja uma fase e que, passada essa carência inicial, as pessoas venham a investir em educação, em um curso técnico, uma universidade”, diz Sergio Vaz. F

Ártico se recupera e ambientalistas aloucados perdem face

http://ipco.org.br/ipco/noticias/artico-recupera-ambientalistas-aloucados-perdem-face#.UmW32fnYiVM
Ártico se recupera e ambientalistas aloucados perdem face
Luis Dufaur
Hielo mar ártico 01, 2012-2013
A superfície gelada do Ártico, que como é rotineiro nos últimos anos vinha se encolhendo no verão, em 21 de agosto 2013 atingiu uma superfície 60% maior que na mesma data do ano passado.
A superfície do gelo atingiu nessa data 2,25 milhões de milhas quadradas (5,83 milhões de quilômetros quadrados). Em 16 de setembro de 2012 ela alcançou o mínimo absoluto do ano, com 1,67 milhão de milhas quadradas (4,34 milhões de quilômetros quadrados) segundo os dados satelitais publicados pela NASA.
A maior expansão da camada de gelo do Polo Norte já registrada foi em 1996, quando o gelo cobria 3,16 milhões de milhas quadradas (8,2 milhões de quilômetros quadrados).
No Polo Norte não há terra embaixo do gelo – como acontece no Polo Sul –, e a superfície gelada forma uma casca de cinco metros de profundidade média – 200 metros nos locais mais densos. Por isso é muito sensível a ligeiras modificações e sua superfície muda muito de ano em ano. Na Antártida, por exemplo, a camada de gelo atinge por vezes 4.000 metros sobre a terra!
Submarinos americanos em missão científica têm emergido no próprio Polo Norte, quebrando essa casca relativamente frágil.
Silenciado pela imprensa, o crescimento cíclico do gelo antártico  é mais importante que o derretimento cíclico do Ártico
Silenciado pela imprensa, o crescimento cíclico do gelo antártico é mais importante que o derretimento cíclico do Ártico
De muito maior envergadura é o que está acontecendo com o gelo da Antártida, no Polo Sul. Ele está no auge de seu ciclo de crescimento e provavelmente chegará à maior extensão já mensurada: 7,45 milhões de milhas quadradas (19,3 milhões de quilômetros quadrados) em 21/08/2013, segundo a mesma NASA.
O fenômeno obedece a fatores peculiares e envolve volumes de água muitíssimo superiores, mas como atrapalha o terrorismo midiático, é pouco ou nada noticiado pela mídia.
O ciclo de crescimento e decrescimento da superfície gelada do Ártico vem sendo acompanhado há muito. Existe hoje farta documentação científica e histórica sobre essas mudanças cíclicas.
Porém o alarmismo exagera, a ponto de seis anos atrás a prestigiada BBC inglesa anunciar que o Ártico ficaria totalmente sem gelo em 2013.
A culpa? Obviamente, só pode ser da civilização responsável pelo “aquecimento global”, segundo reza o Alcorão do fundamentalismo verde.
Porém, mais uma vez, a profecia do alarmismo fracassou. O derretimento total não aconteceu.
Mas não há perigo: os profetas da “neo-religião” ecológica, igualitária e anticristã voltarão à carga com novos pretextos e agouros.
De momento, estão pagando uma conta especial de mais de 20 iates quebrados no gelo ártico. Seus proprietários e tripulantes – “devotos” verdes, crédulos e enganados – haviam planejado neste verão uma bela travessia do Polo Norte.
Eles estão avariados notadamente em Prince Regent Inlet e no Cape Bathurst. Navios quebra-gelo da guarda costeira do Canadá já tinham partido para socorrê-los.
Já tivemos ocasião de publicar neste blog reproduções de jornais da primeira metade do século XX descrevendo uma diminuição do Ártico comparável à dos últimos verões, ficando evidenciado o caráter cíclico do fenômeno.

Quebra-gelo resgata veleiro: a cena passou a se repetir
Quebra-gelo resgata veleiro: a cena passou a se repetir
Porém, o catastrofismo midiático silenciou os dados que órgãos da mídia, seus colegas, publicaram outrora. Mantiveram assim na ignorância, ou induziram à confusão e/ou engano seus leitores a respeito do “aquecimento global” e de seu suposto efeito sobre o Ártico.
Também tem sido frequente neste ano a publicação de novos recortes de jornal descrevendo o quase derretimento do Ártico em períodos anteriores. Nada, ou quase nada, informou a mídia ao grande público. Nem sequer por respeito aos jornalistas que outrora informaram sobre o fato.
Anunciar, manipulando modelos computacionais, que o Ártico iria desaparecer por culpa do homem, era tão irresponsável quanto anunciar a data do congelamento da Baía de Guanabara projetando matematicamente no futuro o recente aumento do gelo ártico!
A recuperação da camada de gelo no Polo Norte coincide com o ingresso da Terra numa fase de resfriamento global que poderá durar quiçá até 2050 – dependendo a data de fatores naturais e dos critérios de análise utilizados pelos cientistas.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

O Fantástico como Procedimento Estético em Contos de Murilo Rubião

repasso artigo que a minha companheira Rosângela Trindade de Sousa fez para o curso de "Especialização em Literatura" na PUC-SP, no ano de 2002.

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O FANTÁSTICO COMO PROCEDIMENTO ESTÉTICO EM CONTOS DE MURILO RUBIÃO

Rosângela Trindade de Sousa



Introdução

Este presente trabalho terá como finalidade de mostrar o problema da definição do fantástico, pois alguns críticos nos revelam que defini-lo foi uma tarefa muito difícil. No entanto, Todorov (1975) nos pontará que o ponto principal do fantástico é a situação de “ambiguidade”, pois ele nos dirá que o fantástico ocorrerá em uma incerteza. Trata-se de uma hesitação experimentada por um ser que só conhece as leis naturais, em face de um fato aparentemente sobrenatural, portanto seu conceito se define com a relação entre o real e o imaginário.
No primeiro capítulo, nos utilizaremos de Todorov (1975) para apresentar outras definições para o fantástico, no entanto, já no século XX, essas desaparecerão quando Todorov dirá que o homem não hesita mais diante do fantástico, pois uma inversão será feita: “o homem torna-se o objeto fantástico, e passa a ser a regra e não a exceção”.
Neste trabalho, ainda apresentaremos algumas diferenças entre o fantástico do século XIX e o neofantástico, sendo que o primeiro explora a dimensão psicológica, em que o sobrenatural é substituído por imagens assustadoras cuja origem está na loucura, nas alucinações, nos pesadelos. Já no século XX, o fantástico transportou-se para a linguagem, por meio da qual foi criada a incoerência entre elementos do cotidiano e da vida comum.
No segundo capítulo, analisaremos o gênero fantástico de Murilo Rubião no século XX, pois ele pode ser considerado um criador de um mundo à parte, ou seja, seu gênero se desgarra de uma realidade imediata como uma “fantasia” que incorpora o “estranho” no universo ficcional, como também no universo do leitor que se torna o “objeto fantástico”.
Quando Murilo trabalhava com o gênero fantástico em suas obras, o que mais espantava nele é a sua perfeita naturalidade da convivência com o espantoso que acarreta um humorismo áspero, revoltado e um sarcasmo maltratante. Dessa maneira, verificamos que o fantástico “muriliano” questiona o problema da loucura, do real e da razão, denuncia a angústia do homem alienado pelas forças dominantes, dramatiza a questão do desejo e sua interdição além de propiciar, na autocontemplação da criação metapoética, um voltar-se da obra sobre si mesma, na expectativa de que ela se descubra enquanto projeto criador.
Por fim, no último capítulo, veremos como Murilo preparava a linguagem fantástica nos seus contos, pois ele incorporava algumas figuras (metáforas, paradoxos, hipérboles e repetições) que funcionavam como procedimentos estéticos, as quais desvendavam os mecanismos fantásticos da sua narrativa.

Capítulo I: A definição do fantástico na literatura

Alguns críticos nos revelam que definir o que é um termo fantástico, e que obras pertencem ao gênero, foi um trabalho difícil, já que este foi usado especificamente, que transgredisse as leis de causalidade, sob esta denominação encontra-se um universo: o maravilhoso, o estranho, o sobrenatural, o inexplicável e as rupturas com o real.
Na América Latina, podemos citar alguns escritores que utilizam o fantástico como: Jorge Luiz Borges, Julio Cortazar, Gabriel Garcia Marques, entre outros. No Brasil, encontramos as marcas do fantástico em Álvares de Azevedo, Machado de Assis, Monteiro Lobato, Mario de Andrade, entre outros. No entanto, o fantástico aparece fortemente nas obras de Murilo Rubião, Jorge Miguel Marinho e José J. Veiga.
Mas o que seria, então, o fantástico na literatura? Em Introdução à literatura fantástica, Tzvetan Todorov (1975) salienta que o ponto principal do fantástico é a situação de “ambiguidade”. No entanto, as histórias que pertencem a este gênero nos deixam as perguntas. “Realidade ou Sonho?” “Verdade ou Ilusão?” Quando um leitor se encontra com um mundo que é exatamente como o seu, qualquer acontecimento que fuja às leis desse mundo familiar cria a duvida e a incerteza sobre a possibilidade do fato ser ou não real.
Todorov dirá que o “fantástico ocorre nesta incerteza (...). O fantástica é a hesitação experimentada por um ser que só conhece as leis naturais, face a um acontecimento aparentemente sobrenatural. O conceito de fantástico se limita a relação entre o real e o imaginário” (Todorov, 1975: 31). O autor ocorrerá a outras definições de fantástico, assegurando que, em algumas, “cabe ao leitor hesitar entre as duas possibilidades” e, em outras, esta hesitação fica à mercê da personagem. O limite entre o estranho e o maravilhoso é apenas o tempo de uma hesitação. Segundo o crítico, essa hesitação é comum ao leitor e à personagem, porém tem sua duração restrita ao momento da narração do fato. Essa hesitação é a condição primeira do fantástico, mas, há a necessidade de uma postura de leitura em que Todorov ressalta: “o fantástico implica, portanto, não apenas a existência de um acontecimento estranho... mas também uma maneia de ler... que deve ser nem ‘poética’, nem ‘alegórica’” (Todorov, 1975:38). Isto significa que o fantástico nem deve ser lido se remetendo uma outra coisa, nem como uma combinação de palavras, pois no sentido “alegórico”, as palavras deste texto seriam lidas como tendo um outro sentido e no “poético”, também não podem ser vistas como representativas ou como uma sequência verbal que não pretender ir além disso, pois os fatos devem e não devem ser compreendidos como são.
Uma ressalva de Todorov faz às definições do gênero é a da insistência em colocar o “critério do fantástico (...) na experiência do leitor”, mais detalhadamente na experiência do medo ou terror que ela é capaz de provocar. Se a duração do fantástico é a hesitação, então estamos diante de um gênero intensamente frágil, que se pode desfazer a qualquer momento. No entanto, essa definição de Todorov não se estende aos escritores do século XX, pois ele nos dirá neste século há um abandono da hesitação, ou seja, o homem não hesita mais diante do fantástico, pois uma inversão será feita: “o homem tornar-se o objeto fantástico e passa a ser a regra e não a exceção”.
Como, então, definimos o fantástico do século XX? Antes do século XIX, o fantástico surge como reação a um mundo em que o medo não tem mais espaço diante da infabilidade das leis postuladas pela ciência. Por vir contra a esta ordem estruturada, o fantástico funciona como uma ruptura. No entanto, esse fantástico passou a explorar a dimensão psicológica, sendo o natural substituído por imagens assustadoras cuja origem estava na loucura, em alucinações, pesadelos (a causa da angustia estava no interior do sujeito). Já no século XX, o fantástico transportou-se para a linguagem, por meio da qual foi criada a incoerência entre os elementos do cotidiano e da vida comum ( a causa da angustia está na falta de nexo na ordenação de coisas comuns, na falta de sentido, no surgimento do absurdo).
No entanto, a função de estremecer o leitor com a quebra de uma ordem inviolável fica perdida com a ampliação do horizonte em quase todas as áreas do conhecimento humano e a relativização do que se entendia por absoluto, a “ordem inviolável” sofre transformações. Este mundo ordenado é substituído por um mundo de ambiguidade, sempre aberto para uma revisão, tanto dos valores quanto das certezas. Desse modo, o fantástico perde a sua função, já que a inovação fará parte de uma nova ordem. Portanto, a definição passa a ser necessariamente o seu contrário: a indefinição. São estes “signos abertos à indefinição”, denominados metáforas que possibilitam a transcendência de limites, mesclando o natural e o sobrenatural.
Ressaltamos que tanto no fantástico tradicional quanto no neofantástico, os fatos transgridem as leis da causalidade. No segundo fantástico, no entanto, nem leitores, nem personagens hesitam diante destes fatos. A opção pelo gênero acaba sendo a opção pela possibilidade de transgressão ou inovação.

Capitulo II: O gênero fantástico de Murilo Rubião

Constatamos que Murilo Rubião inaugurou o gênero fantástico do século XX em suas obras, no entanto, ele deve ser visto como um inventor de um mundo a parte, ou seja, seu gênero se desgarra  de uma realidade imediata como uma “fantasia” que incorpora o “estranho” no universo ficcional, como também no universo do leitor, tornando-o “objeto fantástico”. Quando Murilo trabalha com o gênero fantástico, o que mais espanta nele é a perfeita naturalidade da convivência com o espantoso que acarreta um humorismo áspero, revoltado e um sarcasmo maltratante.
Dessa maneira, verificamos que o fantástico “muriliano” questiona o problema da loucura, do real e da razão; denuncia a angústia do homem alienada pelas forças dominantes, dramatiza a questão do desejo e a sua interdição, além de propiciar, na autocontemplação da criação metapoética, um voltar-se da obra sobre si mesma, na expectativa de que ela se descubra enquanto projeto criador.
Adentro de um mundo imaginário, Murilo conduzia um narrador geralmente em primeira pessoa, vítima do desagrado e do cansaço, lúcido e descrente, incapaz de qualquer susto, incapaz e sempre infeliz, derrotado e, ao mesmo tempo injustiçado com os fatos inusitados e a atmosfera opressiva de sua penosa existência.. Por fim, um mundo, reduzido e confinado em um círculo, no entanto, se cumpra à risca, como se obedecesse a um tratado lógico, tudo projetado com a perspectiva do humor e da ironia. Às vezes, aproximando-se do cômico e, num grau absolutamente sério, a graça e a crueldade infantis de uma farsa circense, com efeito aumentado pela transparência da linguagem, na tradição da escrita mineira, sem vangloriar de si mesma, porém, quase sempre, a linguagem do contista tende para um fundo trágico, onde caem e se encerram personagens sem horizontes.
Anteriormente, citamos que, tanto o narrador quanto o leitor, são cúmplices desse mundo imaginário do fantástico, só que há uma diferença em que o sonho pode apresentar uma conexão orgânica semelhante à do mundo ficcional, sendo que o mundo “muriliano” é produto da intenção de um autor que busca a construção dos elementos estranhos no contexto da realidade cotidiana, mediante a paralisação da surpresa. Trabalhando com materiais muitas vezes arrojados ou arbitrários, torna-se capaz de sugerir, pela transgressão da causalidade, do espaço ou do princípio de identidade do ser, o “clima onírico”. Pode-se, casualmente, utilizar esse tipo de material, extraindo-se diretamente dos sonhos, como o próprio Murilo declara ter acontecido o episódio de “Epidólia”. Entre outros casos, se poderia mesmo suspeitar que a intenção artística fosse a de imitar a aparente desconstrução e incongruência com que nosso mundo ressurge na tela movimentada às vezes do pesadelo, tornando-se particularmente marcada na leitura desses contos como: “A casa do girassol vermelho”, “Petúnia”, “Os comensais”, “O convidado”, “O bloqueio” entre outros.
Entre esses contos, o leitor, ao se reconhecer como narrador ou como personagem em que recai no foco narrativo, ele é levado a exercer o papel de um sonhador cúmplice, mais necessariamente, de alguém que tem a sensação de estar dentro do mundo criado, ao mesmo tempo em que se vê fora. Portanto, ele se torna o mediador par um mundo ficcional, sendo parte integrante deste, está até certo ponto distanciado, na situação de quem sonha acordado, com uma lucidez minuciosa que tende a desempenhar a experiência de que está vivendo e, na maioria dos fatos, narrando.
Não se surpreendendo, esse mundo nos encaminha para a familiaridade com o estranho, fazendo do mundo de fora uma extensão do de dentro e sugerindo uma continuidade efetiva entre o fantástico e o real. Então, vivemos o choque da estranheza, mas logo somos levados a nos sentir em casa diante do disparate. Significa que não estamos a salvo, temos a obrigação de estar dentro, vendo-nos, entretanto, de fora. Por meio deste procedimento, nos transformamos em integrantes de um mundo deslocado, que, paradoxalmente, é ainda o nosso.
Por outro lado, não devemos evidentemente contemplar esse mundo, porque fazemos parte dele e já não conseguimos escapar à sua disposição rotineira para a catástrofe – “a reviravolta fantástica”. Em consequência, quando a técnica não malogra, o leitor é leva a participar de um mundo ficcional, sendo que ainda é o seu mundo, onde dissolve o estranho na rotina, pode, então, perceber melhor, à distância, numa visão crítica, sua própria vulgaridade. Como a outra, a da ficção, ela também parece estar minada, rotinizando os mais espantosos desastres. A realidade meramente dada aos olhos como normal passa a ser um engano. O fantástico, então, dá lugar ao afloramento de um real mais fundo.
Entretanto, essa energia crítica, nascida da negação de uma dada realidade, só se configura a partir do mundo à parte, preso como um sonho. Ao penetrar nele, o leitor cúmplice se sente acuado numa situação de enclausuramento. Desse modo, citamos o personagem de “O bloqueio” que acaba sitiado num edifício em demolição progressiva, roído por uma ameaça iminente de destruição, que não se efetiva até o final do relato, nem tampouco permite que se encontre a saída. Em um fato terrível como esse, estamos sob a pressão de um sonho ruim e, de fato, no inicio do conto se alude ao “sono pesado” do personagem e à sua tendência para confundir “restos de sonhos com fragmentos da realidade”. Logo após, um barulho violento se interpõe, indicando a estranha demolição do edifício “recém-construído”, e o arranca mais de uma vez do sono, para abrigá-lo a viver às claras o pesadelo. E, com ele, o leitor.
Talvez se possa dizer que o narrador ou o personagem que introduz o ponto de vista interno da ficção “muriliana”, acomodando-nos aos princípios de estruturação desse mundo às avessas, é sempre um sonhador desperto. No conto “Ofélia, meu cachimbo e o mar”, fica evidente o que isto possa significar para a compreensão do modo de ser da arte de Murilo. O Narrador, numa situação propícia ao sonho acordado (após o jantar, cachimbando, sentado defronte ao mar) se entregava diversas conversas com a Ofélia, reconstruindo o passado marítimo de sua família, sem fazer gosto da parceira, só interessada em relatos de caçada. No final do conto, o leitor se espanta ao saber que Ofélia é um cachorro. “Desse modo o conto é assim, o resultado de longa fantasia, cujos elementos romanescos – as imaginárias façanhas marítimas – voltam a terra, com o latido forte do animal, que deve suportar mentiras fantasiosas em troca do prato de comida” (ARRIGUCCI JR, 1987: 148).
Enfim, a fantasia sustenta a arquitetura do conto, representa o lance da aventura e realiza, imaginariamente, um desejo de novas sensações, bloqueado, ao que parece, pelos hábitos sedentários do narrador e por sua origem enclausurada: “um vilarejo de Minas, agoniado nas fraldas da Mantiqueira”. Oposto à serra, o mar abre o vasto espaço dos sonhos e do amor: “o meu amor pelas mulheres veio do mar”, diz o narrador, desperto para as vozes e as promessas das águas. Mas “os sonhos, sonhos são” (ARRIGUCCI JR, 1987: 148).
No entanto, o narrador não só interliga o universo do sonho à realidade exterior, na verdade, se coloca no meio da contradição entre o estranho e a rotina. Sendo o mediador para o fantástico, ele próprio é objeto fantástico, pois é por seu intermédio que se instaura o mundo estranho e comum. Nele, portanto, a função de mediar aparece exorbitada; foi convertida num fim em si mesma. Introdutor de um mundo fantástico, ele é já esse mundo, cujos princípios de organização repetem. A ausência de espanto mostra que ele se identifica com as regras de seu universo, como um ser que se remete às leis da organização a que pertence, sem ter participado de sua elaboração e sem acesso aos fins a que se destina. Por assim dizer, “vai de arrasto”. Como vitima de um destino que o leva a indignar-se ou esbravejar apenas numa esfera reduzida e cada gesto só desenha a mesma impotência. Embora lucido, sua consciência está paralisada, com sua capacidade de ação efetiva: não é sujeito da história. Está ora à margem, ora à deriva, e sempre lhe desprende a dimensão da totalidade em que se acha imerso. Como que hipnotizado, vagueia aos troncos e barrancos, prisioneiro de uma “cadeia de equívocos”.
Nessa expressão se caracteriza os sucessivos desencontros de “O convidado”, pois neste conto, o personagem mediador aceita ritualmente um convite formal para uma festa de finalidade obscura: no local, só consegue se encerrar num labirinto de saídas adiadas, sempre se deixando levar, sem dar com o objetivo para o qual recebeu convite. Todavia, o efeito ambíguo deriva nesse universo ate aqui escrito, com seu jogo de incertezas entre o fantástico e o real que pode conduzir não à cumplicidade, mas a uma reação de desconfiança. Na visão do leitor, pode parecer mistificação, como se também ele estivesse preso a equívocos estranhos ou fosse vitima de uma brincadeira de mau gosto. Quando vislumbra, porém, que a técnica narrativa forma corpo com os temas e está vinculada a certos princípios internos do mundo ficcional, percebe uma coerência mais funda, que passa a exigir interpretação.
Na realidade, o método de Murilo que manobra seus mediadores para envolver o leitor no seu jogo, correlaciona a uma articulação interna e complexa, cujo sentido apenas se tocou na descrição. Contradições recorrentes e mutuamente relacionadas, entre estranho e banal, sonho e vigília, fantasia e rotina, fantástico e real, apontam para rumos comuns e parecem repercutir nos efeitos de envolvimento e distancia do sonhador e seu cumplice. Penetrar até ela, buscando os princípios que regem sua organização na estrutura dos contos, é o caminho para se entender não apenas a justificativa profunda da técnica, garantia de organicidade e da eficácia estética da obra, mas os princípios gerais dos significados que possa ter.

Capítulo III: A linguagem fantástica em Murilo Rubião

Percebemos que o fantástico só sobrevive por meio da linguagem, criando assim uma contradição em relação ao mundo real que a constitui. No entanto, Murilo engrandecerá essa linguagem através de atributos inseridos ao material narrado para que o leitor se confunda em relação ao mundo real e imaginário. Dessa forma, teremos na linguagem “muriliana” o predomínio da metáfora que se enriquece na medida da força do seu “estranhamento”, ou seja, aquilo que a valoriza é o seu efeito insólito.
Desse modo, citamos o conto “Teleco, o coelhinho”, no qual o narrador/personagem se depara com constante transformação do coelhinho que ora é animal ora é ser humano. Metaforicamente o animal se torna humano quando estabelece um discurso dialógico com o narrador, daí, nesse caso, ocorre o efeito do “estranhamento”. Por meio desse processo, o elemento fantástico nasce nesse momento como um “desvio” narrativo, sendo captado semanticamente pelas suas peculiaridades que ajudam a defini-lo. Exemplificamos o início do conto “Teleco, o coelhinho”.
“- Moço, me dá um cigarro?
A voz era sumida, quase um sussurro. Permaneci na mesma posição em que me encontrava, frente ao mar, absorvido com ridículas lembranças.
O importuno pedinte insistia:
- Moço, oh! Moço! Moço, me dá um cigarro?
Ainda com os olhos fixos na praia, resmunguei:
- Vá embora, moleque, senão chamo a polícia.
- Está bem moço. Não se zangue. E, por favor, saia daminha frente, que eu também gosto de ver o mar.
Exasperou-se a insolência de quem assim me tratava e virei-me, disposto a escorraçá-lo com um pontapé. Fui desarmado, entretanto. Diante de mim estava um coelhinho cinzento, a me interpelar delicadamente:
- Você não dá é porque não tem, não é moço?”[1]
Nesse exemplo, a personagem não questiona a presença do coelhinho, mas faz com que nós o aceitemos no ato da leitura. Esta combinação é feita graças à extraordinária força dos dados miméticos que representam o discurso, e a fusão fantástico/cotidiano é imediata, não havendo espaço para surpresas, dúvidas ou desconfianças. O pedido inicial de um cigarro toma conta da intriga, diluindo totalmente o efeito que a presença fantástica de um coelho possa ter como personagem interlocutor:
“Diante de mim encontrava-se um coelhinho cinzento, a me interpelar delicadamente” (p. 143).
No entanto, o diminutivo “coelhinho” e o advérbio “delicadamente” diminuem o efeito do estranhamento. E, reforçando a integração no desenrolar da intriga, a discussão a respeito do cigarro é retomada como se fosse o único elemento que realmente interessa às duas personagens, reduzindo o tempo de inverossimilhança:
“Dei-lhe o cigarro e afastei-me para o lado, a fim de que ele visse o oceano. Não fez nenhum gesto de agradecimento, mas já então conversávamos como velhos amigos”. (p.144)
A combinação é dominante, por meio de três elementos:
1) Oferta do cigarro;
2) Participação mútua do narrador e da personagem (verem juntos o oceano);
3) Integração afetiva dos dois (“como velhos amigos”).
Podemos, ainda, assegurar que neste exemplo, a verossimilhança é sustentada por uma equivalência determinada pelo desejo semelhante das duas personagens – o lazer (contemplação do mar e cigarro). Por outro lado, o inverossímil predomina com o seu tempo de integração do discurso verossímil, por exemplo, o estranho aparecimento dos dragões, no conto “Os dragões”, é inicialmente questionado pelas personagens do conto. Inverossímeis pela sua repentina presença entre os seres humanos, eles vão sendo sintonizados paulatinamente pelos “efeitos do real” do discurso, até que a verossimilhança do mesmo os integre e os iguale aos homens. O tempo deste processo inexiste em “Teleco, o coelhinho”, onde a vitória do verossímil é evidente.
Outro atributo importante que está na linguagem fantástica “muriliana” é a figura do paradoxo, a qual se define como uma proposição aparentemente absurda, resultante da reunião de idéias contraditórias que nos remete ainda à “ironia” que consiste na inversão de sentido: afirma-se o contrário do que se pensa, visando à sátira ou à “ridicularização”. Desse modo, esta fusão de elementos antagônicos, ou inconciliáveis na sua essência, vai de encontro à linguagem de Murilo Rubião.
Por outro lado, vida ou morte do conto “Pirotécnico Zacarias” não apresentam uma oposição, eliminado a logica disjuntiva baseada na formula das conjunções ou/ou. O duplo vida/morte convive com o pirotécnico como uma entidade única de tempo, sem necessidade da convencional sucessão cronológica.
Vida – morte.
A ambiguidade surge ao passo que o personagem/narrador descreve as incrédulas reações daqueles que o circundam. Ninguém concebe que “Zacarias vivo” e “Zacarias morto” sejam a mesma personagem. E Zacarias, como é que ele explica o fato?
“Em verdade morri, o que vem de encontro à versão dos que crêem na minha morte. Por outro lado, também não estou morto, pois faço tudo o que fazia e, devo dizer, com mais agrado do que anteriormente” (p. 26).
Percebemos como o próprio personagem/narrador concilia as possíveis oposições que levam a eliminar as ambiguidades decorrentes de sua situação, fazendo paradoxalmente da ambiguidade a estabilidade da narrativa. Assim, em um primeiro momento, o retorno do pirotécnico causa espanto a apenas um dos interlocutores, enquanto os outros assimilam a nova informação:
“Jorginho empalideceu, soltou um grito surdo, tombando desmaiado, enquanto os seus amigos, algo admirados por verem um cadáver falar, se dispunham a ouvir-me” (p. 30).
A partir desse momento, a inversão não é mais vista como tal, pois se instaura como equilíbrio permanente dentro do discurso, havendo uma contaminação total do elemento insólito no mundo sólito. Desta forma, o fantástico se define como um gênero onde o desequilíbrio acaba se convertendo dentro da narrativa, em fator constante, como uma regularidade própria do equilíbrio. Assim, Zacarias participa então do mundo dos vivos, com todas as prerrogativas dos mesmos, mas sem esquecer que pertence também ao universo dos mortos. Observa ele:
“(...) os rapazes ficaram indecisos, sem encontrar uma saída que atendesse, a contento, às minhas razões e o programa da noite, a exigir prosseguimento. Para tornar mais confusa a situação, sentiam a impossibilidade de dar rumo a um defunto que não perdera nenhum ds predicados geralmente atribuídos as vivos” (p.30).
Portanto, o conto “Pirotécnico Zacarias”, faz do verossímil uma vitória e uma fortaleza de sua escritura, e consegue atingir “o significado do fantástico literário que se encontra na sua própria existência”. O discurso fantástico se compara então com a função poética da linguagem, não apenas por pertencer ao universo da ficção, mas pelo caráter independente de sua realidade.
Na linguagem, ainda se destaca a figura da hipérbole, que é o procedimento configurador do fantástico, e é por meio dela que o absurdo se manifesta na obra “muriliana”, a partir da forma de expressão. Segundo os estudos de Roland Barthes em “L’ancienne, retorique/aide – memoire”, percebemos que a hipérbole se expressa sob dois aspectos: aquela que exagera por aumento, a “auxesis” (ex.: “... o corpo de barbara, que, de tão gordo, quinze homens dando as mãos, uns aos outros, não conseguiram abraçá-lo”) e a “Tapinosis”, que exagera por diminuição (ex.: “... vi que o seu corpo diminuíra espantosamente. Ficara reduzido a alguns centímetros de altura...”). Ambos os exemplos, adaptam-se a uma nomenclatura tipo hipérbole por dilatação e hipérbole por contração, respectivamente.
No entanto, a maioria dos contos de Murilo se apoia no primeiro caso, na “auxesis”, que se caracteriza por acréscimo quantitativo. Assim, no conto “Bárbara”, a exacerbação progressiva de uma vontade desenfreada cria um processo reiterativo e acumulativo: a cada novo pedido, um novo objeto é incorporado ao seu hiperbólico acervo (arvore de vinte metros de altura, o oceano, um navio, uma estrela), mimetizando concomitantemente no crescimento do seu corpo colossal. Esse sistema de adjunção é semelhante àquele que se processa no conto “O edifício”, onde a progressiva construção de andares revela-se limitada. A hipérbole não parece ter fim determinado, o que vem confirmar a proximidade da relação forma/conteúdo, ou seja, a hipérbole como forma de expressão que formaliza o conteúdo do conto, havendo um entrosamento entre o nível teórico e o seu correspondente semântico. “O discurso ficcional também se coaduna com o princípio de construção do edifício: O conto (...) permanece ironicamente aberto para um contar inacabável: enquanto o edifício ganhar altura” (SCHARTZ, 1981: 71), observa Davi Arrigucci, demonstrando a superposição do narrar o fato narrado.
As progressões nos contos de Murilo Rubião demonstram-se processos incontroláveis, que escapam à vontade dos sujeitos da ação. (O crítico, no mesmo estudo, comparou este processo ao mito do aprendiz de feiticeiro). É o exemplo do conto “Aglaia”, onde o casal, após evitar contatos sexuais e se esterilizar, continua gerando filhos, que “nasciam com seis, três, dois meses e ate vinte dias após a fecundação. Jamais vinham sozinhos, mas em ninhadas de quatro e cinco. Do tamanho de uma cobaia, cresciam com rapidez, logo atingindo o desenvolvimento dos meninos normais” (p. 193); ou no conto “Teleco, o coelhinho”, que antes da morte é vitima das irrefreáveis transformações que tomam conta do seu corpo. Podemos afirmar, então, que a acumulação acaba se tornando personagem central.
Este sistema de ampliação atinge não apenas as próprias personagens ou objetos circundantes, mas também classes cronológicas. Assim, o conto “A armadilha” cria o elemento fantástico no final, por meio de uma hipérbole temporal, que eleva para o infinito: “- Aqui ficaremos: um ano, dez, cem ou mil anos” (p. 157). A forma hiperbólica pode se apresentar invertida (tapinosis), como é o caso do conto “O homem do boné cinzento”, que relata o gradativo desaparecimento de Anatólio e Artur, porém o fantástico não se limita ao movimento físico regressivo, mas também se manifesta por descrições de caráter expressivamente surrealista:
“Assustei-me. Através do corpo do homenzinho viam-se objetos que estavam no interior da casa: jarra de flores, livros, misturado com intestinos e rins. O coração parecia estar dependurado na maçaneta da porta cerrada somente de um dos lados”. (p. 74-75).
A diminuição física, acarretando ao desaparecimento total, é tema central do conto “O bloqueio”, que relata a progressiva desmontagem de um prédio. O movimento redutivo é bidirecional: de cima para baixo e vice-e-versa:
“Pela tarde, a calma retomou ao edifício, encorajando Gérion a ir ao terraço para averiguar a extensão dos estragos. Encontrou-se a céu aberto. Quatro pavimentos haviam desaparecido, como se cortados meticulosamente, limadas as pontas dos vergalhões, serradas as vigas, trituradas as lajes. Tudo reduzido a fino pó amontoado nos cantos”. (p. 246).
E mais tarde:
“Oito andares abaixo, a escada terminou abruptamente. Um pé solto no espaço, retrocedeu transido de medo, caindo para atrás” (p. 249).
Esta imagem cumpriu a uma força centrípeta que tem o homem por alvo nuclear. Seu gesto final de auto-ensinamento é destacado na sentença que fecha o conto: “cerrou a porta com a chave” (p. 251), e os índices do discurso denunciam o aspecto fragmentário/metonímico do movimento regressivo: “tudo reduzido a pó amontoado nos cantos”, “apenas o pó amontoado nos cantos do lote”, “no ar pairou durante segundos uma poeira colorida”, “restos de sonhos”, “fragmentos de realidade”, “estilhaçava ao desintegrar-se”, etc. este processo da redução se apresenta diametralmente oposta ao movimento de expansão do conto “O edifício”; assim, dilatação/contração, montagem/desmontagem, força centrífuga/centrípeta definem-se como expressões hiperbólicas geradoras de uma linguagem fantástica nos contos “murilianos”.
Anteriormente, analisamos o processo de acréscimo ou diminuição por contiguidade, do qual a hipérbole funciona como figura-chave, desvendando os mecanismos fantásticos da narrativa, porem inclui também a repetição. Como o pleonasmo e a hipérbole, a repetição pode “engordar” o evento ou “aumentar” as coisas. A hipérbole, como figura-chave por excelência na linguagem “muriliana”, apoia-se na repetição para sua realização no discurso. Dessa forma, o numero de objetos mágicos inventados pelo ex-mágico mostra o aspecto reiterativo dos fatos que se repetem ate a saturação: “cobras, lagartos, coelhos, jacaré, sanfona, pombo de algibeira, urubu, cobra, pássaro, mãos que crescem novamente, leões, pára-quedas, revólver transformando-se em lápis”. O numero de transfigurações pelas quais passa Teleco é ainda maior, até as exaltantes metamorfoses que antecedem sua morte. Já no conto “Petúnia”, a repetição se destaca como um processo hiperbólico reiterativo, por meio do “enterrar” e “desenterrar” das Petúnias, cujo movimento circular em moto continuo faz com que a ação, desprevenida de conteúdo, se semantize penas por sua forma:
“Não dorme. Sabe que os seus dias serão consumidos em desenterrar as filhas, retocar o quadro, arrancar as flores. Traz o rosto constantemente alagado pelo suor, o corpo dolorido, os olhos vermelhos, queimando. O sono é quase invencível, mas prossegue” (p. 186).
Esta coerência da repetição alcança dimensões mais amplas no conto “A fila”, onde a personagem, em suas vãs tentativas de conversar com o gerente do local, volta a estar num lugar cada vez mais distante da fila, não conseguindo jamais atingindo os fins inicialmente propostos, porem nesse conto, o meio se torna o próprio fim, pois a repetição do processo lhe confere inusitada dimensão semântica: uma verdadeira forma do vazio. No entanto, neste processo, percebemos que há dois níveis de significação, onde o significante indicado para o infinito, acaba produzindo o significado retórico: “Esta repetição ‘infinita’ é inerente a um pensamento que gira em torno do campo transformacional do signo. Por outro lado, ela aponta, ela aponta ela aponta para o desequilíbrio do sistema simbólico entre o significante e o significado: o significado permanecendo o mesmo, o significante repete-se ao infinito, e graças a esta repetição, que é uma autogeração, ele gera um significado secundário, o ignificado retórico” (SCHWARTZ, 1981: 74).
No entanto, há acontecimentos em que a repetição não se diminui a um mero fazer redundante por parte das personagens. É o que se dá com os fatos narrativos, que nada mais são do que uma nova repetição de sua própria história. Exemplificamos “O pirotécnico Zacarias”, cujo pai, “Zacarias sênior, também tinha morrido”, porém, neste exemplo, a repetição se dá no plano da fabula, e não apenas da trama. Exemplo semelhante ocorre no conto “A noiva da casa azul”, onde o ódio se apresenta como elemento ancestral, genético, herdado dos pais:
“Sim, ao encontro de Dalila. De Dalila que, em menina, tinha o rosto sardento e era uma garota implicante, rusguenta. Não a tolerava e os nossos pais se odiavam. Questões de divisas dos terrenos e pequenos casos de animais que rompiam tapumes, para que maior fosse o ódio dos dois vizinhos”. (p. 53)
Portanto, as figuras possuem a função de criarem uma ruptura no sistema de expectativas do leitor na dimensão poética. Mas o que ocorre, quando os desvios da obra criam um sistema de redundâncias retoricas, como é no caso dos contos “murilianos”? Exatamente, a idéia de absurdo em Murilo Rubião, para a qual dirigem técnicas e temas narrativos, que é o resultado de um equilíbrio constante estabelecido por um desequilíbrio inicial, para qual leva ao “non sense”, numa destituição da significação, num esvaziamento de conteúdos. Se por um lado, a hipérbole é uma forma inicial de rompimento, por outro ela conduz, pelo próprio processo de redundância, à noção de ausência para a qual se direciona a estrutura da obra.

CONCLUSÃO

Nesse trabalho, verificamos que o gênero fantástico “muriliano” não possui um desfecho, pois ele sempre esteve aberto para possíveis transformações. Por isso, Murilo foi considerado um criador de um mundo à parte, pois ele tinha o habito de reescrever incessantemente seus textos, mesmo depois de publicados, sendo que ele mudava parágrafos e nome dos personagens, alterava títulos e ate mesmo o desfecho dos contos sempre buscando a perfeição inovadora na sua linguagem.
Dessa forma, o gênero de Murilo implica no desprendimento de uma realidade imediata como uma “fantasia” que incorpora o “estranho” no universo ficcional como também no universo do leitor que se torna “o objeto fantástico”. Então, nós, leitores, somos cumplices desse mundo fantástico, mais necessariamente, temos a sensação de estar dentro desse mundo criado e, ao mesmo tempo, nos vemos de fora dele numa situação de quem sonha acordado, com uma lucidez minuciosa que tende a objetivar a experiência que está vivendo e, na maioria dos casos narrando. Não se espantando, pois esse mundo nos encaminha para a familiaridade com o estranho, fazendo do mundo de fora uma extensão do de dentro e sugerindo uma continuidade efetiva entre o fantástico e o real.
No entanto, vivemos o abalo da estranheza, mas logo somos levados a nos sentir m casa ao lado do disparate. Por assim dizer, não estamos a salvo, temos a obrigação de estar dentro desse mundo, vendo-nos, entretanto, de fora. Mediante este procedimento, nos transformamos em participante de um mundo deslocado que paradoxalmente, é ainda o nosso.
Podemos dizer, quando Murilo elaborava seu gênero fantástico, o que causava espanto nele é a sua perfeita vivencia com o espantoso que implica num absurdo e um sarcasmo maltratante. Dessa forma, o fantástico “muriliano” denuncia o problema da loucura, do real e da razão; denuncia a angustia do homem alienado pelas forças dominantes, enfim, tudo se direciona para contradições recorrentes e mutuamente relacionadas, entre o estranho e banal, sonho e vigília, fantasia e rotina, fantástico e real, sendo que estes servirão de base para a construção do gênero fantástico “muriliano”.
Portanto, no gênero “muriliano”, não devemos esquecer a questão da linguagem, onde Murilo realiza um trabalho muito importante. Utiliza algumas figuras de linguagem como: metáforas, paradoxos, hipérboles e reiterações que desvendarão os mecanismos do fantástico na narrativa “muriliana”. Dessa forma, Murilo enriqueceu sua linguagem fantástica através dos mecanismos e procedimentos estéticos colocados ao material narrado, para que nós leitores, acreditássemos nos fatos narrados.

BIBLIOGRAFIA

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MORAES, Marcos Antonio de. Mário e o Pirotécnico Aprendiz. Belo Horizonte: Editora UFMG, São Paulo: IEB-USP, São Paulo: Editora Giordano, 1995, p. 248.
RUBIÃO, Murilo. Contos Reunidos. São Paulo: Editora Ática, 1999, p. 279.
SCHWARTZ, Jorge. Murilo Rubião: A poética do Uroboro. São Paulo: Editora Ática,1981, p. 54-82
TODOROV, Tzvetan. Introdução à literatura fantástica. São Paulo: Editora Perspectiva, 1975, p. 191.





[1] Rubião, Murilo: “Contos Reunidos”, 1999, p. 143-144.