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terça-feira, 22 de dezembro de 2015

3 CAMPANHAS PUBLICITÁRIAS NEOMALTHUSIANAS:





São 3 CAMPANHAS PUBLICITÁRIAS NEOMALTHUSIANAS:
  • FRANÇA = incentiva o aumento das taxas de natalidade e de fecundidade no país, para combater a falta de mão-de-obra, aumentar o desemprego e rebaixar os salários no país (criando o "exército industrial de reserva"). É uma estratégia à longo prazo, sendo mais viável "importar imigrantes".
  • NEPAL e CHINA =  incentiva a diminuição das taxas de natalidade e de fecundidade no país, para combater o excesso de mão-de-obra e diminuindo o número de desempregados no país (diminuindo o "exército industrial de reserva").

Cartaz Xenófobo (Ódio ao Imigrante)


Contradições Religiosas - para reflexão





Cuidado da Retórica LEGALISTA


Cuidado da Retórica LEGALISTA

MELHOR definição de MAIS-VALIA

MELHOR definição de MAIS-VALIA

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Para ONDE estão INDO os MORADORES das FAVELAS REMOVIDAS em SÃO PAULO?

 · by 



A plataforma online Habisp (Sistema de informações para Habitação Social na cidade de São Paulo) disponibiliza os dados que a Prefeitura tem sobre as “demandas habitacionais no município”, considerando as favelas que serão total ou parcialmente removidas em função de obras e intervenções urbanas. Dessa maneira, é possível visualizar em mapas, disponíveis na plataforma, tanto as favelas a serem removidas como os reassentamentos previstos.
Apesar do avanço que isso representa em relação ao aumento de transparência por parte da Prefeitura de São Paulo no que diz respeito à política habitacional, a plataforma ainda não é ideal e encontrar as informações é um grande desafio. Visando apresentar os dados de forma mais clara, o Observatório de Remoções procurou organizar, em uma mesma base de dados, diferentes informações para, a partir daí, cruzá-las e analisá-las.
Foram utilizadas duas estratégias diferentes de tratamento dos dados: uma utilizando as densidades Kernel; outra construindo mapas de fluxos. A densidade Kernel permite representar os valores dos objetos inseridos nos mapas, e não sua quantidade; desta forma o que importa não é apenas o número de empreendimentos novos e de favelas, mas a quantidade de unidades habitacionais envolvidas. Os dois mapas abaixo apresentam, respectivamente, o número total de famílias das favelas onde estão previstas ou em andamento intervenções¹ de diferentes programas e ações na cidade e o número das unidades habitacionais que estão sendo ou serão construídas nos empreendimentos que receberão famílias reassentadas².
Já os mapas de fluxo (abaixo) retratam, em uma mesma base, tanto as favelas com intervenções quanto os reassentamentos para onde parte dos moradores será realocada. É possível observar de onde saem e para onde vão as famílias que serão removidas. Assim, é possível ter uma visão da movimentação populacional forçada na cidade.

legenda
À primeira vista, torna-se clara uma concentração de destinos nas regiões periféricas da cidade. Com pouquíssimas exceções, os reassentamentos concentram-se fora dos limites do centro expandido. Além disso, já se percebe que as únicas regiões com intervenções e realocações na área referente à mesma subprefeitura são Jabaquara e Ipiranga. Em todas as outras áreas, os locais onde serão construídas casas para reassentamento receberão famílias que moravam em outras regiões (em áreas de outra subprefeitura), às vezes afastadas vários quilômetros de seu local inicial de moradia.
Observa-se também uma grande concentração de destinos em algumas regiões da cidade. As áreas próximas às zonas de proteção de mananciais nas bacias das represas Billings e Guarapiranga concentram diversos atendimentos muito distantes das áreas de moradia iniciais das famílias atendidas. No caso do atendimento de 275 famílias da comunidade Parque Novo Santo Amaro IV, no reassentamento Emccamp – Espanha, um dos maiores empreendimentos da cidade, com 3860 unidades habitacionais previstas, as famílias terão percorrido 13,4 km de deslocamento forçado em relação às suas moradias iniciais.
Na zona leste também serão construídos vários conjuntos habitacionais, e, curiosamente, algumas favelas próximas a alguns desses conjuntos serão realocadas para áreas bem mais distantes.
Já as subprefeituras do Butantã e de Perus receberão também grande quantidade de unidades novas, o Parque Raposo – Reserva Raposo e o UNO – Nova Perus, que contam, respectivamente, com 13002 e 5454 unidades habitacionais previstas. Esses são os dois maiores empreendimentos de reassentamento de São Paulo que estão localizados nas áreas limítrofes da cidade e concentram grande número de atendimentos da região e do entorno. O deslocamento das futuras famílias atendidas será de até 10,5km no Butantã e 24,1km em Perus. A enorme dimensão desses empreendimentos, que se destacam no conjunto da cidade, levanta questões em relação à disponibilidade de infraestrutura urbana, serviços, cultura e lazer para acolher os futuros novos moradores, em áreas que já apresentam precariedade nesses quesitos.
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¹ Em relação às favelas com intervenções, somente foram consideradas aquelas que o Habisp especifica onde se dará o atendimento habitacional por meio de reassentamento, o que não corresponde ao total de famílias atingidas por essas intervenções.
² Em relação aos empreendimentos de reassentamento, somente foram considerados aqueles onde constam a origem dos reassentados.


Fonte: http://observatorioderemocoes.com/2015/10/22/para-onde-estao-indo-os-moradores-das-favelas-removidas-em-sao-paulo/

ONTEM e HOJE - Casa Grande, Senzala, Navio Negreiro e Capitão do Mato

Casa Grande, Senzala, Navio Negreiro e Capitão do Mato







Casa Grande, Senzala, Navio Negreiro e Capitão do Mato

domingo, 22 de novembro de 2015

Formas de Relevo - atividade




Utilizando de vasilhas de plástico, tinta azul e argila (ou massinha para modelar) é possível representar os mais diversas formas de relevo.

Fontehttp://www.geografiacriativa.com.br/geografia-fisica/geomorfologia/

RESENHA com TÓPICOS de “CIDADES INVISÍVEIS” de ÍTALO CALVINO

repasso resenha que fiz em 2008.

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RESENHA COM TÓPICOS DE “CIDADES INVISÍVEIS” DE ÍTALO CALVINO

O livro foi inspirado “As Viagens de Marco Polo”, livro de memórias escrito por Marco Pólo no século XIII.  Os primeiros a viajar foram os irmãos Polo (Nicolau -pai de Marco e Mateus), entre 1261 e 1269, sendo os primeiros europeus a desbravar terras do extremo Oriente do globo, até então desconhecidas ou ignoradas pela civilização européia. Entre 1271 a 1295 Nicolau Polo leva seu filho Marco Polo para a continuidade da viagem, obtendo sucesso e os transformando em diplomatas do Império Tártaro e contato comercial de Veneza. No Oriente tínhamos civilizações muito desenvolvidas e diferentes entre si, cuja maior parte fazia parte do Império Tártaro (ver mapa em anexo) que eram comandadas pelo imperador Kublai Khan.
Marco Pólo escreveu o relato das memórias de sua viagem aos domínios do Império Tártaro, domínios estes que de tão extensos não eram totalmente conhecidos pelo seu imperador. Kublai Khan confia principalmente a Marco Polo a responsabilidade de descrever estes lugares, tão desconhecidos e com costumes exóticos de seu povo. Kublai Khan chega a se afeiçoar tanto a Marco Polo, que chega a lhe confiar a administração de um importante território (a província de Mangi). Por muitos anos o livro de Marco Polo, com suas minuciosas descrições geográficas, administrativas, econômicas, políticas e culturais dos povos do Oriente, serviram de base para os comerciantes e os navegadores europeus.
Ítalo Calvino no ano de 1972 se apropria magistralmente desta história e cria uma narrativa de memórias e conversas informais entre Marco Polo e Kublai Khan, cabendo a Polo a missão de descrever para Khan as cidades do Império Tártaro que estavam sendo por ele visitadas, na qual Khan não podia ver com seus olhos. Marco Polo se transforma numa “versão transfigurada de Sherazade” (do livro “As Mil e Uma Noites”) e descreve as coisas que mais lhe chamavam a atenção nas, aproximadamente, 55 cidades desbravadas.
O livro “Cidades Invisíveis” nos permite refletir sobre vários assuntos filosóficos, tais como o real e o mito, o real e sua descrição, o incompreendido e o imaginado, as referências e a memória, os símbolos e a individualidade do ser, etc. Estas discussões também nos permitem entender como funciona o ser humano em sociedade e como ocorrem as dilapidações das relações sociais no cotidiano crítico das aglomerações urbanas.
Temos em cada capítulo várias discussões e passagens interessantes, entre estas posso citar:

- “Mas a cidade não conta o seu passado, ela o contém como as linhas da mão, escrito nos ângulos das ruas, nas grades das janelas, nos corrimãos das escadas, nas antenas dos pára-raios, nos mastros das bandeiras, cada segmento riscado por arranhões, serradelas, entalhes, esfoladuras” . (pág 16 de As Cidades e as Memórias 3);
- Verificamos que os desejos e as individualidades das pessoas são cada vez mais controlados e reprimidos para a conservação da totalidade e coesão social;
- Os símbolos contêm e escondem fatos e desejos das pessoas;
- Os sentidos que são construídos socialmente e individualmente;
- A cidade é feita também de sonhos e desejos não somente da mente, acaso e da racionalidade;
- Deve se ter conhecimento das antigas e das atuais aflições do povo antigo ou recém-conquistado do seu reino ou cidade. Sem conhecer suas lamentações, não se poderá controlar e dominar um povo por completo.
- “Você sabe melhor que ninguém sábio Kublai, que jamais se deve confundir uma cidade com o discurso que a descreve. Contudo, existe uma relação entre eles” (pág. 61 de As Cidades Delgadas 4).
- a “cidade do lazer” e a “cidade do trabalho” que necessitam uma da outra, se influenciando profundamente;
- os bairros transitórios de Eutrópia, que são verdadeiras táticas de especulação imobiliária e de controle social. Temos uma falta de rotina e um grande fluxo social, por termos as pessoas mudando radicalmente de atividade (modo de vida), mas essas trocas em nada afetarão a funcionalidade (modo de produção) da cidade (sociedade). (As Cidades e as Trocas 3)
- o discurso sobre o real poderá impossibilitar um desenvolvimento discursivo e identitário sobre a cidade.
- Uma cidade que contenha “todas as cidades possíveis” seria uma feita “só de exceções, impedimentos, contradições, incongruências, contra-sensos”. (Diálogo do fim da Parte 4)
- A cidade de Melânia, onde temos uma cadeia de diálogos que se renovam e que se reestruturam constantemente, sendo imprevisíveis as funções das pessoas na rede de relações da cidade. ("As Cidades e os Mortos 1")
- a cidade de Esmeraldina onde temos um emaranhado de ruas e vias, que faz com que nada se repita. ("As Cidades e as Trocas 5")
- cidade de Clarice onde as pessoas reutilizam os espaços da antiga cidade, perdendo-se a memória da primeira.
- Em Leônia temos uma cidade consumista e materialista, cujos habitantes amam o novo, repelindo o velho e gostam do ritual da troca e desprendimento. Quanto mais a cidade expele, mais se acumula escama de seu passado numa couraça intransponível e duro. O lixo é depositado longe da cidade (nas periferias?), que está sempre à vista e prestes a “desabar” (caos social?) sobre a cidade. ("As Cidades Contínuas 1")
- as pessoas que não conhecem o projeto da cidade de Tecla, apenas constroem alienadamente. ("As Cidades e o Céu 3")
- “(...) uma nova cidade que abre espaço em meio à primeira cidade e impele-a para fora”. ("As Cidades Ocultas 1")
- “(...) enquanto cada forma não encontra a sua cidade, novas cidades continuarão a surgir. Nos lugares em que as formas exaurem as suas variedades e se desfazem, começa o fim das cidades”. (Diálogo do Começo da Parte 9)

- “O inferno dos vivos não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno no qual vivemos todos os dias, que formamos estando juntos. Existem duas maneiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte deste até o ponto de deixa-lo de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas: tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e preserva-lo, e abrir espaço”. (Diálogo do Fim da Parte 9)

RESENHA: LÓGICA da DESORDEM – Lúcio Kowarick

repasso reflexão que fiz em 2008.
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LÓGICA DA DESORDEM – Lúcio Kowarick

Este texto surgiu em 1976 quando a Pontifícia Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo realizou um estudo sobre a urbanização da cidade de São Paulo. Os pesquisadores Vinícius Caldeira Brant e Lúcio Kowarick foram os coordenadores deste estudo chamado “São Paulo 1975 – crescimento e pobreza”, que continha um Capítulo 2 intitulado de “Lógica da Desordem”.
O livro queria estudar o crescimento da cidade de São Paulo do ponto de vista social e econômico da população trabalhadora, constatando o processo desigual da urbanização paulistana. O capítulo “Lógica da Desordem” questionava o crescimento desordenado da cidade, as contradições no tocante à divisão das riquezas dos seus moradores e assim como a desigualdade no acesso aos espaços públicos.
Anos depois, em 1993, Lúcio Kowarick decide republicar este texto em um novo livro chamado “A Espoliação Urbana”, cujo capítulo conteria o mesmo nome da primeira publicação. O texto é muito parecido ao primeiro, possuindo somente algumas modificações e atualizações, não perdendo seu potencial crítico e questionador do processo desigual da urbanização paulistana.
Kowarick queria entender a expansão urbana (os serviços, infra-estrutura, relações sociais e níveis de consumo) ligada ao processo de acumulação do capital. Utilizando-se de muitos dados estatísticos da cidade, tentava-se entender a desconexão de espaços vazios e ocupados, sub-entendendo que os problemas não estão na cidade de São Paulo inteira, mas principalmente nas suas periferias.
Num primeiro momento procura entender a desigualdade espacial de São Paulo e dá um histórico de suas moradias populares e de trabalhadores. Na década de 1930 tínhamos um começo da industrialização na cidade e os próprios donos das empresas quem se responsabilizavam pelas habitações dos trabalhadores nas chamadas vilas operárias (casas alugadas ou vendidas aos operários). Estas vilas eram viáveis economicamente ao patrão porque: os terrenos próximos às empresas eram muito baratos (geralmente localizavam-se em terrenos de várzea e próximos das ferrovias); havia uma pequena quantidade de operários na época possibilitando este empreendimento; o rebaixamento do salário dos operários, pois por morarem próximo ao serviço, suas despesas seriam menores.
A cidade até então se resumia em alguns pontos dispersos e localizados de urbanização, mas a partir da década de 1950 os espaços da cidade mudarão profundamente. Por advindo da intensificação da industrialização e da urbanização, teremos agora uma grande explosão demográfica (destaque pela migração de famílias vindas em sua grande parte do Nordeste, Minas Gerais e do interior do estado de São Paulo), um encarecimento dos terrenos fabris e residenciais, além de uma pressão por habitações populares.
Os burgueses que até então se responsabilizavam pelas “vilas operárias”, não necessitarão mais destas e transferem os gastos de moradia e de transporte para o próprio trabalhador, além do serviço urbano básico para o Estado. Estávamos tendo um significativo desenvolvimento do capitalismo na cidade de São Paulo. Podemos afirmar que neste momento surge o “Mercado Imobiliário” e a “Periferia” (“aglomerados distantes dos centros, clandestinos ou não, carentes de infra-estrutura, onde passa a residir crescente quantidade de mão-de-obra necessária para fazer girar a máquina econômica”, pág. 35).
Como acumulação e especulação andam juntas, a localização da classe trabalhadora passou a seguir os fluxos dos interesses especulativos dos grupos imobiliários privados. O poder público sempre se ausentou da tarefa de dar um mínimo de ordem no uso do solo da cidade e colocará esta responsabilidade do desenho urbano para os grupos privados. O Estado-burguês é reformista e atende aos interesses particulares, colocando-se à serviço da dinâmica de valorização-especulação do sistema imobiliário-construtor.
As conseqüências desta lógica desordenada de urbanização são: a pouca quantidade de área verde na cidade, ruas não pavimentadas, pouca rede de esgotos e de água, além de áreas desprovidas de iluminação.
A especulação imobiliária será um fator importantíssimo na cidade de São Paulo e o autor descreve um exemplo prático de especulação imobiliária: pois quando temos uma “área vazia” entre dois loteamentos, esta possivelmente se valorizará porque está sendo constantemente cortada por um fluxo constante de trabalhadores e cidadãos comuns.
Com a especulação imobiliária teremos agora uma intensificação da expansão horizontal de urbanização paulistana, não tendo mais como característica fundamental a concentração de áreas distintas e desarticuladas na cidade, mas se articulando áreas periféricas na cidade de São Paulo e também nas cidades da Grande São Paulo.
Ficará cada vez mais em evidência a questão dos transportes na cidade de São Paulo, principalmente para a grande massa de moradores e de trabalhadores de baixa renda que morarão nas periferias, muito distantes dos seus locais de trabalho.
As distâncias na cidade de São Paulo serão cada vez maiores, assim como a quantidade diária de deslocamentos e de carros, aumentando as horas em que as pessoas ficam no trânsito. Projetos milaborantes de engenharia e muitas vias de circulação serão criadas em São Paulo, mas não se tentará um incentivo ao transporte público para combater o crescente número de carros individuais (ocasionados pelo furor individualista e consumista das pessoas, em combinação da necessidade da rapidez em se deslocar na cidade).
Não parece ser uma prioridade dos governantes de São Paulo criar “bolsões de emprego nas periferias”, fato que poderia diminuir significativamente a quantidade de deslocamentos e do trânsito na cidade. É uma necessidade do capitalismo a existência de deslocamentos diários pelas cidades, cabendo ao trabalhador periférico se sujeitar a um tempo de fadiga, um evidente fator de seu esgotamento físico e mental. Se a produtividade do trabalhador cair, ele será sumariamente substituído por outro trabalhador do “exército industrial de reserva”. Para ilustrar esta discussão, Kowarick transcreve um depoimento de um prefeito (não identificado) de Diadema: “Quem trabalha em Diadema, mora fora. Quem mora em Diadema, trabalha fora”.
Os serviços públicos e a infra-estrutura urbana existem à disposição de quem possa pagar por eles, pois a instalação destes pelo Estado dependerá da rentabilidade ou da viabilidade do investimento. Estes bens e serviços se repartem desigualmente na cidade de São Paulo, seguindo a distribuição de renda e o valor de troca dos moradores, tornando-se um importante mecanismo de valorização imobiliária. Podemos dizer que os terrenos caros são aqueles com mais serviços e bens, no qual somente as pessoas ricas poderão morar, pois podem pagar por um alto IPTU e aluguel.
Teremos uma evidente segregação espacial e social na cidade de São Paulo, nas periferias com as habitações populares, conjuntos habitacionais, favelas e os cortiços do centro (que são viáveis pela proximidade do emprego); e as habitações dos ricos que estão distribuídas em locais centrais, mas dispersos na cidade (sempre muito bem protegido pelo aparato repressor estatal).
Os investimentos públicos atuarão muitas vezes como “malas de especulação”, fato que ocorre freqüentemente na construção de infra-estrutura e serviços em zonas decadentes ou estagnadas (como no centro-velho), assim como na construção do metrô, numa canalização de um córrego e na construção de uma rodovia (ex: Rodoanel).
Lúcio Kowarick apontará vários dados estatísticos para demonstrar a dilapidação da força de trabalho e as péssimas condições sociais vivenciadas pelos moradores de baixa renda. Constataremos um agravamento da situação das famílias trabalhadoras em São Paulo, ao verificar os dados da vulnerabilidade do trabalho (com o trabalho repetitivo, acidente no trabalho, aumento das jornadas de trabalho, o ritmo acelerado, a subnutrição e a fadiga no deslocamento), o aumento da mortalidade infantil, a queda da expectativa de vida, a desnutrição e subnutrição alta, a diminuição da quantidade de pessoas com a Previdência Social e da pouca quantidade de redes de esgoto e água.
O autor criticará também ausência de organização sindical que questione a exploração da força de trabalho, assim como da política desigual e ineficiente do BNH (Banco Nacional de Habitação). Fará também uma relação da poluição do ar com as zonas fabris e com a quantidade de crianças com meningite.
Numa cidade capitalista como São Paulo, o que importa é o lucro dos poderosos e não uma resolução da dilapidação das condições sociais. O capital deteriora a vida metropolitana, sendo a cidade e a classe trabalhadora somente uma fonte de lucro. No entanto, para os trabalhadores, a cidade é o mundo onde devem procurar desenvolver suas potencialidades coletivas e sua existência.

Está é uma grande contradição que deve ser combatida desde já.

DADOS sobre PARAISÓPOLIS

DADOS SOBRE PARAISÓPOLIS

Paraisópolis é a segunda maior favela de São Paulo (atrás de Heliópolis com os seus 120 000 moradores em 18 000 domicílios), a quinta do Brasil e a quarta na América Latina. Possui 89 mil moradores, ocupa 1,5 milhões de metros quadrados e agrega 21 mil moradias, incluindo barracos, construções em alvenaria, sobrados e construções mais antigas e sólidas. Cerca de 90% dos imóveis estão irregulares e 55% das famílias residem no local há mais de onze anos, sendo a maioria de novos moradores. Há 3.100 estabelecimentos comerciais e 54 instituições do terceiro setor atuam ali (como ONGs, escolas e hospitais)
Paraisópolis é a única, entre as 1573 favelas de São Paulo, cuja área não pertence ao poder público ou a um pequeno número de proprietários. Ao contrário, era um loteamento muito antigo (alguns citam sua origem em 1923) e eram lotes grandes, chegando a ter 2529 proprietários.
Entre as décadas de 1950-70, ocorreu o boom da construção civil na Zona Sul de São Paulo, bem como o grande fluxo migratório do Nordeste para essa capital. Paraisópolis crescerá nestas décadas, sendo ocupada irregularmente por trabalhadores da construção civil. Isso gerou ações judiciais e dificuldades para a regularização das ocupações, pois os proprietários dos terrenos invadidos deixaram de pagar os impostos, gerando dívidas astronômicas com o fisco municipal.
Em 2007, foi promulgado um decreto permitindo que esses proprietários doassem os terrenos na Paraisópolis (abatendo as dívidas dos impostos), ou trocassem a dívida por certificados da Prefeitura de potencial construtivo (aqueles que podem ser vendidos a construtoras interessadas em erguer edifícios em regiões onde é possível a troca de limites de zoneamento). O ano de 2007 foi também o início da implantação do plano de regularização fundiária e urbanização da favela, pois seu contingente populacional era de tal ordem, que não se poderia mais pensar em retirar a população invasora e sim em regularizar a ocupação. Criou-se um Conselho Gestor de Urbanização de Paraisópolis, o qual elaborou um plano de obras para transformar, gradativamente, a favela em um bairro popular. Os próprios moradores passaram a se autodenominar como moradores e uma "comunidade", não como uma favela.
A população de Paraisópolis evoluiu rápido nos últimos anos, saindo de 65 mil habitantes em 1996 para 89 mil moradores no Censo de 2009. Calcula-se que 80% da população local seja de origem nordestina, porque a região foi, e continua sendo, um grande espaço de acolhimento de migrantes daquela região. Inicialmente, eles vieram para São Paulo a fim de trabalhar na construção do estádio do São Paulo. Alguns ficaram na região e depois foram trabalhar na indústria da construção civil, que teve um boom nos anos 70- 80. Aqueles trabalhadores recepcionaram centenas de parentes e conhecidos do Nordeste, em seus barracos na Paraisópolis. Atualmente, grande parte dos moradores são os faxineiros e porteiros dos edifícios que ajudaram a construir, sendo que suas mulheres e filhas trabalham como empregadas domésticas nas centenas de apartamentos que foram edificados na região.
Em 2008, segundo a Secretaria Municipal de Habitação de São Paulo, o índice de desemprego na favela era de 22,6%. Cerca de 78% dos moradores com emprego fixo trabalham no Morumbi. Em 2009, a renda média era de R$ 614,43.
Paraisópolis possui alta densidade populacional, cerca de 1.000 habitantes por hectare, bem distante dos 28 habitantes por hectare no luxuoso bairro vizinho do Morumbi. Da população de Paraisópolis, somente 25% mora em residências abastecidas de rede de esgoto, metade das ruas não é asfaltada e 60% utiliza meios irregulares para obtenção de energia elétrica.
A questão educacional é crítica na favela de Paraisópolis, pois, em 2008, havia ainda 5000 crianças fora da escola. Apesar da inauguração do CEU em 2008 (com capacidade para atender a 2.800 alunos), dados de 2009 indicam que 54% da população da área possuíam apenas o ensino fundamental, e só 7% ingressaram no ensino superior. Em 2005, por meio de um projeto de urbanização da prefeitura municipal e contando com o apoio de dados da SEHAB, "descobriu-se" que a favela tinha 15 mil analfabetos, cerca de 19% da sua população.
Os dados estatísticos à seguir nos mostram informações valiosas: 
Distritos
Área (km²)
População (1996)
População (2000)
População (2008)
Densidade Demográfica (Hab/km²)
Morumbi
11,47
37.025
34.640
32.508
2.834,02
Vila Sônia
10,02
85.599
87.354
90.196
8.997,71
Cidade Ademar
12,19
238.214
243.297
248.886
20.419,26
Capão Redondo
13,85
218.788
240.353
270.826
19.547,84
Chácara Santo Antônio
2,5
-
4.906
-
1.966
Itaim Bibi
10,02
92.498
81.680
68.863
6.869,59

As populações absolutas e relativas em Paraisópolis estão crescendo significativamente, sendo que o crescimento do bairro se realiza de maneira vertical, com muitas construções de “puxadinho”. O bairro tem se urbanizado bastante nos últimos anos, mas tem muito a ser melhorado, principalmente no campo do saneamento básico, opções de lazer e mobilidade urbana.

Fontes Bibliográficas:
“Morumbi: o contraditório bairro-região de São Paulo” - Maria da Glória Gohn
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-49792010000200005

“Violência em Paraisópolis, a segunda maior favela da cidade” http://vejasp.abril.com.br/materia/violencia-em-paraisopolis-segunda-maior-favela-da-cidade

“Paraisópolis – bairro de São Paulo”
https://pt.wikipedia.org/wiki/Parais%C3%B3polis_(bairro_de_S%C3%A3o_Paulo)

“Dados Demográficos da Zona Sul”
http://www.zonasulsp.com.br/dados-demograficos-da-zona-sul-de-sao-paulo.htm


RESENHA LIVRO: ENSAIO SOBRE a CEGUEIRA

repasso reflexão-trabalho que fiz em 2005 na época estava na graduação do curso de geografia.

Feito conjuntamente com Marcos Roberto Soares Monteiro e Michele Tomeo Pacheco.

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RESENHA LIVRO: ENSAIO SOBRE a CEGUEIRA


“Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios provam apenas que a vida prossegue e nem todos se libertaram ainda. Alguns, achando bárbaro o espetáculo, prefeririam (os delicados) morrer. Chegou um tempo em que não adianta morrer. Chegou um tempo em que a vida é uma ordem. A vida apenas, sem mistificação.”

(DRUMMOND, 1993: 159.).

O presente trabalho destina-se a fazer alguns apontamentos sobre a obra Ensaio Sobre a Cegueira de José Saramago, que nos permite visualizar logo de início a condição humana na sociedade contemporânea. Esta é composta essencialmente por relações sociais desiguais, que contribuem decisivamente na miséria social, política e econômicas, além de manter e reproduzir o status quo.
Este brilhante “livro de ficção” publicado inicialmente em 1995, retrata a cegueira social que se expressa nas relações pessoais dos indivíduos em uma sociedade estruturada na opressão e na desigualdade social. Estamos constantemente suscetíveis a uma “cegueira branca” pelas relações sociais banalizadas e fetichizadas expressadas nas questões cotidianas, podendo usar como exemplo o incidente ocorrido em Brasília no ano de 1996, onde jovens de classe média atearam fogo em um índio sem-teto somente por “diversão”.
       O processo de “desumanisação” nas relações sociais é abordado por Saramago também é perceptível no documentário Cronicamente Inviável, no qual é retratada a contradição social nas situações cotidianas, identificada no desfile de carnaval ou no tráfico de órgãos.
       No livro podemos ver que o “Ter” tornou-se uma palavra de ordem na composição das relações humanas, as quais contribuíram num dado momento para o distanciamento e a “simplificação” dos sentimentos.
       Os elementos contidos nesse nos permitem fazer uma leitura dos sentimentos de amor e afeto que são comercializados e reduzidos na sociedade capitalista, que busca unicamente a reprodução do capital e não de uma ampliação do potencial humano. Visto dialeticamente, o caos é pressuposto e necessidade produtiva de nossa sociedade que se materializa em fenômenos ou em ações sociais.
       Entendemos que o urbano é uma pré-condição e também uma materialização das relações produtivas capitalistas, por se expressar no “modo de vida” dos sujeitos. O livro pode ser compreendido como uma metáfora de como o urbano e os signos da modernidade podem ser cruéis e alienantes.
       A “desumanização” dos indivíduos na sociedade pode ser visto na letra de música a seguir:

“Olá, como vai?
Eu vou indo e você, tudo bem?
Tudo bem, eu vou indo, correndo
Pegar meu lugar no futuro, e você?
Tudo bem, eu vou indo em busca
De um sono tranqüilo, quem sabe?
Quanto tempo...
Pois é, quanto tempo...

Me perdoe a pressa
É a alma dos nossos negócios...
Qual, não tem de que
Eu também só ando a cem
Quando é que você telefona?
Precisamos nos ver por aí
Pra semana, prometo, talvez nos vejamos
Quem sabe?
Quanto tempo...
Pois é, quanto tempo...

Tanto coisa que eu tinha a dizer
Mas eu sumi na poeira das ruas
Eu também tenho algo a dizer
Mas me foge a lembrança
Por favor, telefone, eu preciso
Beber alguma coisa rapidamente
Pra semana...
O sinal...
Eu procuro você...
Vai abrir!!! Vai abrir!!!
Eu prometo, não esqueço, não esqueço
Por favor, não esqueça
Adeus... Adeus...”
(Paulinho da Viola, 1970.).


Este samba de Paulinho da Viola retrata a superficialidade das relações sociais de nossa sociedade que inevitavelmente impede que haja uma reprodução de relações afetivas ou de vivências menos rápidas em detrimento da rapidez nas atitudes ou nas conversas.
Ironicamente este livro começa com um personagem perdendo a visão no seu carro esperando o semáforo (ou sinal para os cariocas como Paulinho da Viola) se abrir. Interessante ressaltar que nenhum personagem possui nome, o que é entendido como uma parábola da modernidade onde somos apenas mais um inserido no mercado consumidor e nas atividades produtivas capitalistas.
      As situações descritas por Saramago nada mais são do que uma crítica sobre o simulacro social vivenciada pela sociedade “moderna” ou urbana, as quais são digeridas de forma superficiais e desiguais, com uma tentativa de auto-superações do tempo pelos indivíduos favorecendo a expansão da “Cegueira Branca” ou uma fragilização do indivíduo, conforme nos relata o autor:
“Passada uma semana, os cegos malvados mandaram recado de que queriam mulheres. Assim, simplesmente, Tragam-nos mulheres. Esta inesperada, ainda que não de todo insólita, exigência causou a indignação que é fácil imaginar, os aturdidos emissários que vieram com a ordem votaram logo lá para comunicar que as camaratas, as três da direita e as duas da esquerda, sem excepção dos cegos e cegas que dormiam no chão, haviam decidido, por unanimidade, não atacar a degradante imposição, objectando que não se podia rebaixar a esse ponto a dignidade humana, neste caso feminina, e que se na terceira camarata lado esquerdo não havia mulheres, a responsabilidade, se a havia, não lhes poderia ser assacada. A resposta foi curta e seca, Senão nos trouxerem mulheres, não comem. Humilhados, os emissários regressaram às camaratas com a ordem, Ou vão lá, ou não nos dão de comer. As mulheres sozinhas, as que não tinham parceiro, ou não tinham fixo, protestaram imediatamente, não estavam dispostas a pagar a comida dos homens das outras com o que tinham entre pernas, uma delas teve o mesmo atrevimento de dizer, esquecendo o respeito que devia ao seu sexo, Eu sou muito senhora de lá ir, mas o que ganhar é para mim, e se me apetecer fico a viver com eles, assim tenho cama e mesa garantida. Por estas inequívocas palavras o disse, mas não passou aos actos subsequentes, lembrou-se a tempo do mau bocado que iria ser se tivesse de agüentar sozinha o furor erótico de vinte machos desenfreados que, pela urgência, pareciam estar cegos de cio. Porém, esta declaração, assim levianamente proferida na segunda camarata lado direito, não caiu em cesto roto, um dos emissários, com particular sentido de ocasião, deitou-lhe logo a mão para propor que se apresentassem voluntárias ao serviço, tendo em conta que o que se faz de moto próprio custa em geral menos do que o que tem de fazer-se por obrigação.”
(SARAMAGO, 2000: 165.).

           A seguinte passagem nos dá margem para fazer uma breve leitura da sociedade contemporânea onde os sentimentos são abstraídos e o contato com o outro cada vez mais é reduzido, ora pelo medo, ora pela violência das ruas, ora pelo estresse ocasionado pela poluição sonora, visual ou pelo ritmo incessante do dia-à-dia dos grandes centros comerciais, tais como São Paulo, Rio de Janeiro ou Nova Iorque.
            Isso nos coloca frente na possibilidade de analisar os valores éticos e morais que estão sofrendo vicissitudes no processo de expansão das metrópoles, que por sua vez favorecem o crescimento de atitudes individualistas, como no isolamento social, possibilitando também o surgimento de “doenças” consideradas “modernas”, tais como a Síndrome de Pânico, Fobia Social entre outras. A seguinte passagem nos permite reforçar o resultado deste processo social:

“Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram. 
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.” 
(DRUMMOND, 1993: 159.).





        Todavia nota-se um distanciamento do outro provocado tanto pelo medo e a insegurança, quanto pela falta de afeto numa vida que perdeu o sentido de ser e de existir, numa sociedade onde os sentimentos são tratados de maneiras descartáveis numa briga individualista pelo consumo. 
O poema “Os Ombros Suportam o Mundo” de Carlos Drummond de Andrade também esboça as idéias contidas no romance: “Ensaio Sobre a Cegueira”, em relação aos sentimentos de angústia e medo que são visíveis nas grandes metrópoles.
Os sentimentos como angústia, medo e tensão refletem na situação de algumas nações, tais como o Argentina onde o Estado perdeu o controle da situação político-econômica que deu margem para expansão e vulgarização da violência presente nas interações cotidianas, levando a sociedade a uma verdadeira “cegueira branca”, praticamente uma guerra civil. Situação semelhante ocorre atualmente na cidade estadunidense de Nova Orleans, onde transpareceu a animalidade e o individualismo humano depois da passagem do furacão Catrina. O bojo desta situação pode ser evidenciado na música a seguir:

“O movimento começou, o lixo fede nas calçadas.
Todo mundo circulando, as avenidas congestionadas.
O dia terminou, a violência  continua.
Todo mundo provocando todo mundo nas ruas.
A violência está em todo lugar.
Não é por causa do álcool,
Nem por causa das drogas.
A violência é nossa vizinha,
Não é só por culpa sua,
Nem é só por culpa minha.
Violência gera violência.
Violência doméstica, violência cotidiana,
São gemidos de dor, todo mundo se engana...
Você não tem o que fazer, saia pra rua,
Pra quebrar minha cabeça ou pra que quebrem a sua.
Violência gera violência.
Com os amigos que eu tenho não preciso inimigos.
Aí fora ninguém fala comigo.
Será que tudo está podre, será que todos estão vazios?
Não existe razão, existe motivos.
Não adianta suplicar porque ninguém responde,
Não adianta implorar, todo mundo se esconde.
É difícil acreditar que somos nós os culpados,
É mais fácil culpar deus ou então o diabo.”
(TITÃS, 1987.).

          A passagem mencionada situa-se no contexto sociopolitico contemporâneo, de uma fragmentação dos sentimentos, tais como o amor ou companheirismo. Ainda assim, os questionamentos apresentados nos dão a possibilidade de elucubrar, sobretudo, a respeito da violência contida em cada indivíduo, que pode ser extravasada num dado momento, ora no serviço através do ritmo incessante da linha de produção, ora na falta de tolerância com a diferença ou a dificuldade.
    Podemos ver durante o livro a complexidade do viver da humanidade, que luta incessantemente pela sobrevivência, tentando superar a fome no sentido amplo da palavra.        O medo ou o desconhecimento são instrumentos mantenedores da ausência do diálogo, ainda mais no sistema capitalista, em que o homem é apenas um número no mercado consumidor.
   Em contrapartida aos avanços tecnológicos temos uma sociedade extremamente sectária que vive num eterno dilema entre a racionalização da informação e a necessidade de saber ouvir o outro. Os sentimentos como o afeto, atenção e respeito pelo próximo foram perdendo o sentido ao longo da história da humanidade, conforme pode verificado na seguinte passagem:



 “Se há remédio para isto, precisamos ambos dele, Recordou-me de o senhor doutor me ter dito que depois de operado nem iria reconhecer o mundo em que vivia, nesta altura sabemos quanta razão tinha, Quando foi que cegou, Ontem à noite, E já o trouxeram, O medo lá fora é tal que não tarda que comecem a matar as pessoas quando perceberem que elas cegaram, Aqui já liquidaram dez, disse uma voz de homem, Encontre-os, respondeu o velho da venda preta simplesmente, Eram de outra camarata, os nossos, enterrámo-los logo, acrescentou a mesma voz, como se terminasse um relatório. A rapariga dos óculos escuros tinha-se aproximado, Lembra-se de mim, levava uns óculos escuros postos, Lembro-me bem, apesar da minha catarata lembro-me que era muito bonita, a rapariga sorriu, Obrigada, disse, e voltou para o seu lugar. Disse de lá, Está aqui também aquele menino, Quero a minha mãe, disse a voz do rapazito, como cansada de um choro um choro remoto e inútil. E eu sou o primeiro que cegou, disse o primeiro cego, estou com a minha mulher, E eu sou a empregada do consultório.” (SARAMAGO, 2000: 120.).


     É interessante como esta “cegueira social” se expande nas relações sociais dos personagens, com os cegos gradualmente perdendo a humanidade. Foi deprimente perceber os atos realizados pelos dirigentes do Estado capitalista ou seus funcionários (como os guardas) com os cegos, que se importavam somente com a manutenção da “ordem” e com a não interferência nas relações produtivas.
         Além dos guardas terem fuzilado muitos cegos indefesos, os dirigentes do Estado tiveram a infeliz idéia de utilizar um manicômio de abrigo para os cegos, transformando o local em um “depósito” de inválidos e de “perigosos” sujeitos. Isto se assemelhou com as ações “higienistas” que o governo nazista de Adolf Hitler realizou com a população alemã (especialmente os judeus e comunistas) nos anos 30 e 40 do século passado, as quais podem ser identificadas no filme: Arquitetura da Destruição.
      Os fatores descritos também nos favorecem ter uma abordagem ampla que nos possibilita visualizar como as interações sociais são resultantes das relações produtivas e materiais de um grupo social. A situação de cegueira aliada com uma impossibilidade material e do ambiente vivido nos permite verificar como a sociedade capitalista e as relações sociais individualistas são cruéis com os indivíduos que não tem em momento algum respeitado suas individualidades.
      É importante destacar a difícil situação vivenciada pela mulher do oftalmologista, pois podia enxergar todas as arbitrariedades realizadas pela sociedade e todo processo de decadência da humanidade dos cegos. Ela estava numa sinuca de bico, pois tinha a responsabilidade de enxergar por todos e vivia constantemente com pena e raiva dos cegos (os internos e os dirigentes do governo) e com um forte remorso de sua situação “vantajosa” perante os demais.
       Diante das questões mencionadas podemos também identificar como o conhecimento se fragmenta e se vulgariza. Num dado momento passa a atender uma parcela reduzida da sociedade mundial, como nas questões referentes à manipulação e a sonegação do conhecimento, tais como na biopirataria (realização de patentes pela Monsanto) ou na fragmentação do saber pelo cartesianismo.
     A leitura deste livro somente reforça a importância da utilização da arte para as análises científicas, pois além de situar o imaginário do escritor, localiza as preocupações e vivências dos indivíduos nesta sociedade, que impõe constantemente aos “cidadãos” um bojo de ações e papéis sociais através das superestruturas e aparatos repressores e ideológicos. A realidade e seus sujeitos são entendidos dialeticamente como sendo objetiva e subjetiva, sendo resultados das necessidades produtivas e sociais.
Buscamos passar longe de niilismos ou estar abarcado numa perspectiva comodista do ser humano e da realidade, pois entendemos ser necessária a existência de uma perspectiva de mudança completa da realidade das coisas, ou seja, acreditar que um sistema baseado na exclusão e diferenciação de classes, tal qual o capitalista, tenha de ser combatido e derrotado.
Como muito bem é mostrado no livro de Saramago, jamais devemos “dar uma face humana” ao capitalismo, pois este é desumano em sua essência. Também temos de visualizar que é muito problemático pensar que devemos transformar o que é “possível”, pois isto pode beirar o reformismo. Após o fechamento dos olhos temos de sonhar com o impossível, pois além do sonho ser o “patrono da ciência” é o que move a realidade e nos possibilita recuperar a lucidez e o afeto humano.




  
  

Bibliografia

ANDRADE, Carlos Drummond de. A Rosa do Povo, São Paulo, Editora Circulo do livro, 1945, pp.197.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Corpo, 16 ª Edição, Rio de Janeiro, Editora Record, 202, pp. 168.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Sentimento do Mundo, 5ª Edição, Rio de Janeiro, Editora Record, 1993, pp. 176.
Associação Palas Athenas. Valores que não têm Preço – Textos para Aprofundamento e Reflexão, pp.87.
CARVALHO, Marcos Bernardino, “Geografia e Complexidade”. In Silva, A. A. D. & Galeno, A. (orgs.). Geografia, ciência do complexus. Porto Alegre: Editora Sulina, 2004.
MORIN, Edgard. Introdução ao Pensamento Complexo. Lisboa: Instituto Piaget, 1991.
SARAMAGO, José. O Ensaio Sobre a Cegueira, São Paulo, Editora Companhia das Letras, 2000, pp. 310.

DISCOGRAFIA

BARÃO Vermelho, Supermercados da Vida, 1991.
BARÃO Vermelho, Carne Crua, 1994.
GAVIN, Charles & Brito, Sérgio. Trecho Extraído da Letra “Violência” do CD: Jesus não tem Dentes no País dos Banguelas - Titãs, 1987.
TITÃS, Cabeça Dinossauro, 1986.
VIOLA, Paulinho da, Letra “Sinal Fechado” do CD: Foi um Rio que Passou em Minha Vida, 1970.