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domingo, 22 de novembro de 2015

RESENHA com TÓPICOS de “CIDADES INVISÍVEIS” de ÍTALO CALVINO

repasso resenha que fiz em 2008.

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RESENHA COM TÓPICOS DE “CIDADES INVISÍVEIS” DE ÍTALO CALVINO

O livro foi inspirado “As Viagens de Marco Polo”, livro de memórias escrito por Marco Pólo no século XIII.  Os primeiros a viajar foram os irmãos Polo (Nicolau -pai de Marco e Mateus), entre 1261 e 1269, sendo os primeiros europeus a desbravar terras do extremo Oriente do globo, até então desconhecidas ou ignoradas pela civilização européia. Entre 1271 a 1295 Nicolau Polo leva seu filho Marco Polo para a continuidade da viagem, obtendo sucesso e os transformando em diplomatas do Império Tártaro e contato comercial de Veneza. No Oriente tínhamos civilizações muito desenvolvidas e diferentes entre si, cuja maior parte fazia parte do Império Tártaro (ver mapa em anexo) que eram comandadas pelo imperador Kublai Khan.
Marco Pólo escreveu o relato das memórias de sua viagem aos domínios do Império Tártaro, domínios estes que de tão extensos não eram totalmente conhecidos pelo seu imperador. Kublai Khan confia principalmente a Marco Polo a responsabilidade de descrever estes lugares, tão desconhecidos e com costumes exóticos de seu povo. Kublai Khan chega a se afeiçoar tanto a Marco Polo, que chega a lhe confiar a administração de um importante território (a província de Mangi). Por muitos anos o livro de Marco Polo, com suas minuciosas descrições geográficas, administrativas, econômicas, políticas e culturais dos povos do Oriente, serviram de base para os comerciantes e os navegadores europeus.
Ítalo Calvino no ano de 1972 se apropria magistralmente desta história e cria uma narrativa de memórias e conversas informais entre Marco Polo e Kublai Khan, cabendo a Polo a missão de descrever para Khan as cidades do Império Tártaro que estavam sendo por ele visitadas, na qual Khan não podia ver com seus olhos. Marco Polo se transforma numa “versão transfigurada de Sherazade” (do livro “As Mil e Uma Noites”) e descreve as coisas que mais lhe chamavam a atenção nas, aproximadamente, 55 cidades desbravadas.
O livro “Cidades Invisíveis” nos permite refletir sobre vários assuntos filosóficos, tais como o real e o mito, o real e sua descrição, o incompreendido e o imaginado, as referências e a memória, os símbolos e a individualidade do ser, etc. Estas discussões também nos permitem entender como funciona o ser humano em sociedade e como ocorrem as dilapidações das relações sociais no cotidiano crítico das aglomerações urbanas.
Temos em cada capítulo várias discussões e passagens interessantes, entre estas posso citar:

- “Mas a cidade não conta o seu passado, ela o contém como as linhas da mão, escrito nos ângulos das ruas, nas grades das janelas, nos corrimãos das escadas, nas antenas dos pára-raios, nos mastros das bandeiras, cada segmento riscado por arranhões, serradelas, entalhes, esfoladuras” . (pág 16 de As Cidades e as Memórias 3);
- Verificamos que os desejos e as individualidades das pessoas são cada vez mais controlados e reprimidos para a conservação da totalidade e coesão social;
- Os símbolos contêm e escondem fatos e desejos das pessoas;
- Os sentidos que são construídos socialmente e individualmente;
- A cidade é feita também de sonhos e desejos não somente da mente, acaso e da racionalidade;
- Deve se ter conhecimento das antigas e das atuais aflições do povo antigo ou recém-conquistado do seu reino ou cidade. Sem conhecer suas lamentações, não se poderá controlar e dominar um povo por completo.
- “Você sabe melhor que ninguém sábio Kublai, que jamais se deve confundir uma cidade com o discurso que a descreve. Contudo, existe uma relação entre eles” (pág. 61 de As Cidades Delgadas 4).
- a “cidade do lazer” e a “cidade do trabalho” que necessitam uma da outra, se influenciando profundamente;
- os bairros transitórios de Eutrópia, que são verdadeiras táticas de especulação imobiliária e de controle social. Temos uma falta de rotina e um grande fluxo social, por termos as pessoas mudando radicalmente de atividade (modo de vida), mas essas trocas em nada afetarão a funcionalidade (modo de produção) da cidade (sociedade). (As Cidades e as Trocas 3)
- o discurso sobre o real poderá impossibilitar um desenvolvimento discursivo e identitário sobre a cidade.
- Uma cidade que contenha “todas as cidades possíveis” seria uma feita “só de exceções, impedimentos, contradições, incongruências, contra-sensos”. (Diálogo do fim da Parte 4)
- A cidade de Melânia, onde temos uma cadeia de diálogos que se renovam e que se reestruturam constantemente, sendo imprevisíveis as funções das pessoas na rede de relações da cidade. ("As Cidades e os Mortos 1")
- a cidade de Esmeraldina onde temos um emaranhado de ruas e vias, que faz com que nada se repita. ("As Cidades e as Trocas 5")
- cidade de Clarice onde as pessoas reutilizam os espaços da antiga cidade, perdendo-se a memória da primeira.
- Em Leônia temos uma cidade consumista e materialista, cujos habitantes amam o novo, repelindo o velho e gostam do ritual da troca e desprendimento. Quanto mais a cidade expele, mais se acumula escama de seu passado numa couraça intransponível e duro. O lixo é depositado longe da cidade (nas periferias?), que está sempre à vista e prestes a “desabar” (caos social?) sobre a cidade. ("As Cidades Contínuas 1")
- as pessoas que não conhecem o projeto da cidade de Tecla, apenas constroem alienadamente. ("As Cidades e o Céu 3")
- “(...) uma nova cidade que abre espaço em meio à primeira cidade e impele-a para fora”. ("As Cidades Ocultas 1")
- “(...) enquanto cada forma não encontra a sua cidade, novas cidades continuarão a surgir. Nos lugares em que as formas exaurem as suas variedades e se desfazem, começa o fim das cidades”. (Diálogo do Começo da Parte 9)

- “O inferno dos vivos não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno no qual vivemos todos os dias, que formamos estando juntos. Existem duas maneiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte deste até o ponto de deixa-lo de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas: tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e preserva-lo, e abrir espaço”. (Diálogo do Fim da Parte 9)

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