REPASSO TEXTO QUE FIZ
____
A Falácia do “Conceito” de
“Desenvolvimento Sustentável” e Contradições do Movimento Ambientalista
Sem natureza
não há sociedade, sem sociedade não há natureza. As análises cientificas tem
muita dificuldade de “por a natureza na discussão da sociedade”, até porque
discutir natureza é discutir sociedade.
A natureza
não pode ser entendida simplesmente como o lugar onde os homens podem tirar as
coisas para seu sustento ou talvez possam morar. Ela tem de ser compreendida de
uma maneira mais ampla, pois o homem é parte integrante da natureza.
Temos de integrar o homem
à natureza, mas também temos de saber diferenciá-lo na natureza. Como já foi
dito anteriormente, “o homem é a natureza que toma consciência de si mesma”. Isto significa que o homem tem de ser integrado e
diferenciado. Podemos também afirmar que “quando um homem explora outro homem, está explorando uma parte da
natureza” (BLUWOL, 2009, p.44).
No entanto,
dizer somente que “o homem é parte integrante da natureza” é insuficiente, esta
critica em si não basta, este entendimento é um acréscimo insignificante. Não
basta ter “consciência ecológica” ou saber que “o homem é parte integrante da
natureza”. A crítica tem de ser mais estrutural do que ideológica (retomarei
esta crítica estrutural no final deste sub-capitulo).
Temos de
entender “qual é a nossa consciência de noção da natureza” e ter a ”consciência
do conceito de natureza da nossa sociedade” para se poder criticar e superar
este conceito. Segundo BLUWOL (2009, p.50):
Quem destrói o seu meio
ambiente é certa parcela da humanidade sob certa cultura, que gera certo
conceito de natureza, que na prática é a própria relação desses humanos com o
resto da natureza. Em nosso mundo, essa relação pode ser entendida como o
próprio modo de produção capitalista.
O Homem sempre interferirá
na natureza, pois ele necessita dela para a sua sobrevivência. HARVEY (2004,
p.266) diz que:
(...)
Nossas idéias, concepções, visões (ou seja, nossa “consciência”) se altera em
função de cada mudança das condições materiais da existência e que a forma
material de um modo de produção dá origem a estruturas políticas,
institucionais e legais que aprisionam nossos pensamentos e possibilidades de
maneiras particulares.
É
necessário que se faça a reflexão já debatida neste capítulo: “sem natureza não há sociedade e sem sociedade
não há natureza”. Seria equivocado achar que o ser humano deveria parar de
interferir na natureza, pois isso sempre ocorreu e sempre ocorrerá. O que deve
ser questionado é a degradação predatória e irracional dos recursos naturais e
ambientes terrestres, que diminuem a qualidade de vida humana e o equilíbrio da
vida neste planeta. Portanto, é equivocado a visão que diz que o homem não pode
interferir na natureza, pois sempre vai interferir, só que com menor ou maior
intensidade, de acordo com o modo de produção das sociedades.
De acordo com seu Modo de
Produção, as Sociedades podem interferir mais ou menos na natureza, ou conceber
o Homem como sendo superior ao restante da natureza. A sociedade Capitalista
interfere mais no Meio Ambiente e concebe o homem como sendo superior ao
restante da natureza.
O ser humano desde o
momento em que “controlou o fogo” vem provocando alterações continuas e
substanciais na atmosfera e nos ambientes terrestres. Entretanto, este ser
humano vivente na sociedade capitalista está cada vez mais degradando ambientes
terrestres, explorando intensivamente os elementos da natureza e degradando boa
parte dos ambientes.
O Capitalismo interfere
mais no Meio Ambiente porque somos uma sociedade altamente tecnológica e
consumista. Os objetos tecnológicos precisam muito de natureza (seja ele um
computador, um avião ou uma embalagem plástica) e o consumismo é uma
necessidade da sociedade capitalista (pois o rápido consumo gira a economia de
mercado e impossibilita riscos de crises de superprodução).
O Desenvolvimento
Sustentável é uma idéia que só pode surgir na sociedade capitalista, sendo
incompatível numa sociedade que não concebe a natureza como recurso natural
(como a indígena e a socialista). A idéia de Desenvolvimento Sustentável foi
Influenciada por preceitos neomalthusianos, a crítica ambientalista tem fortes
influências neomalthusianas e carrega um ranço “catastrofista”.
A sociedade capitalista
cria esta idéia de Desenvolvimento Sustentável para racionalizar ainda mais sua
exploração de recursos naturais e por “achar” que estava destruindo em demasia
a natureza. ALTVATER (2006, p.341-47) reflete que a “crise ecológica” e a noção
de Sustentabilidade surgirão a partir do momento que a sociedade capitalista se
torna planetária e necessitará de natureza (matéria-prima, custos de produção)
para a realização de capitais. Neste sentido, a degradação da natureza é
degradação das condições gerais de produção, onde a Sustentabilidade significa
uma racionalidade na gestão de recursos para não haver esgotamento e danos para
a sociedade capitalista.
A Idéia de
“Desenvolvimento Sustentável” começa a ser formatada na Primeira Conferência
Mundial das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente (em 1978) e surge para se
“opor” às idéias do “Clube de Roma” (formado em 1968, dizendo que a terra tinha
recursos naturais limitados e defendia como solução o controle de natalidade e
do crescimento econômico dos países pobres). As idéias do Clube de Roma serão
publicadas no relatório “Os limites do
crescimento” (de 1971) e que será a base da Conferência de Estocolmo
(organizado pela ONU em 1972). A ideologia do relatório “Os limites do crescimento” pode ser
observado na passagem de MEADOWS (1973, p.19.):
Se as
atuais tendências de crescimento da população mundial — industrialização,
poluição, produção de alimentos e diminuição de recursos naturais — continuarem
imutáveis, os limites de crescimento neste planeta serão alcançados algum dia
dentro dos próximos cem anos. O resultado mais provável será um declínio súbito
e incontrolável, tanto da população quanto da capacidade industrial.
É
possível modificar essas tendências de crescimento e formar uma condição de
estabilidade ecológica e econômica que se possa manter até um futuro remoto. O
estado de equilíbrio global poderá ser planejado de tal modo que as
necessidades materiais básicas de cada pessoa na Terra sejam satisfeitas, e que
cada pessoa tenha igual oportunidade de realizar seu potencial humano
individual.
Se a
população do mundo decidir empenhar-se em obter esse segundo resultado, em vez
de lutar pelo primeiro, quanto mais cedo ela começar a trabalhar para
alcançá-lo, maiores serão suas possibilidades de êxito.
Estas idéias elitistas e
preconceituosas foram amenizadas no relatório “Nosso Futuro Comum” (publicado
pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1987) ao
dizer que não são os países pobres os maiores responsáveis pela devastação do
planeta, mas os países mais ricos, que consomem mais recursos e geram mais
poluição. O relatório “Nosso Futuro Comum” foi assinado pelos representantes
dos países no Eco-92, já com nome de Agenda 21. A idéia de Desenvolvimento
Sustentável foi consagrada no ECO-92, sendo entendida como meta a ser atingida
pelos países e está presente até os nossos dias. O significado de
Desenvolvimento Sustentável é explicado no relatório “Nosso futuro comum”, que pode ser visualizado em COMISSÃO
MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO (1991, p.46):
O
desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem
comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas próprias
necessidades.
Ele
contém dois conceitos-chave:
O
conceito de “necessidades”, sobretudo as necessidades essenciais dos pobres do
mundo, que devem receber a máxima prioridade.
A
noção das limitações que o estágio da tecnologia e da organização social impõe
ao meio ambiente, impedindo-o de atender às necessidades presentes e futuras.
Portanto,
ao se definirem os objetivos do desenvolvimento econômico e social, é preciso
levar em conta sua sustentabilidade em todos os países — desenvolvidos ou em
desenvolvimento — com economia de mercado ou de planejamento central. Haverá
muitas interpretações, mas todas elas terão características comuns e devem
derivar de um consenso quanto ao conceito básico de desenvolvimento sustentável
e quanto a uma série de estratégias necessárias para sua consecução.
(...)
A humanidade é capaz de tornar o desenvolvimento sustentável — de garantir que
ele atenda às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das
gerações futuras de atenderem também às suas. O conceito de desenvolvimento
sustentável tem, é claro, limites — não limites absolutos, mas limitações
impostas pelo estágio atual da tecnologia e da organização social, no tocante
aos recursos ambientais, e pela capacidade da biosfera de absorver os efeitos
da atividade humana. Mas tanto a tecnologia quanto a organização social podem
ser geridas e aprimoradas a fim de proporcionar uma nova era de crescimento
econômico. Para a Comissão, a pobreza generalizada já não é inevitável. A
pobreza não é apenas um mal em si mesma, mas, para haver um desenvolvimento
sustentável, é preciso atender às necessidades básicas de todos e dar a todos a
oportunidade de realizar suas aspirações de uma vida melhor. Um mundo onde a
pobreza é endêmica estará sempre sujeito a catástrofes, ecológicas ou de outra
natureza.
Os ideais do ambientalismo
se utilizam o tempo todo ideais do neomalthusianismo, pois se preocupam com a
Divisão Internacional do Trabalho (DIT) ao dizer que se deve conter o
crescimento econômico e populacional dos países (principalmente os
subdesenvolvidos e os emergentes/em desenvolvimento) e se racionalizar a
produção. Isto está expresso nos preceitos discutidos no Clube de Roma (cujas
idéias estão reunidas no relatório “Os Limites do Crescimento”), na Conferência
de Estocolmo de 1972 e na Conferencia de Copenhague em 2009 (que é extremamente
conservadora e retoma ideais presentes em “Os Limites do Crescimento” e da
Conferência de Estocolmo).
O ideário de
“Desenvolvimento Sustentável” tenta superar as contradições ambientais da
sociedade capitalista e as contradições dos relatórios elitistas anteriores,
mas, na realidade, nunca conseguirão atingir este objetivo, porque não é de sua
essência e porque só se preocupam fazer críticas ideológicas (e não
estruturais). Por mais que estes ideais tentem ser aprofundados em relatórios
da ONU (como o IPCC, o CDB e o IPBES[1]),
nunca ficou claro como colocar em prática a “sustentabilidade”. Compreendo que
esta nunca será aplicada integralmente em uma sociedade capitalista.
RODRIGUES (2005, p.93) não
concorda que “desenvolvimento sustentável” seja um conceito, mas um termo ou
“um ideário que oculta as causas e as conseqüências da problemática ambiental”:
O
termo “desenvolvimento sustentável” não é um conceito, mas uma idéia que
pretende encontrar soluções para problemas de esgotamento, poluição das
riquezas naturais, num futuro... Idéia genérica que abstrai a realidade, oculta
a complexidade, a reflexividade do modo de produção de mercadorias, cria uma
espessa cortina de fumaça sobre a apropriação dos territórios, a existência de
classes sociais, dificulta a análise crítica.
Neste mesmo artigo,
RODRIGUES (2005, p.96-97) diz que o ideário de Desenvolvimento Sustentável é
alienante, pois mantém o modo de produção capitalista e atribui os problemas
ambientais aos desvios do “modelo” de cada país. SANTOS (2005, p.148) diz que: “o ambientaIismo
seria uma redução, embora assumindo ares de cientificidade em nome da
salvaguarda do planeta”, ou seja, fazem uma verdadeira confusão conceitual
entre “sistemas técnicos, natureza, sociedade, cultura e moral”. SANTOS (2005, p.149) citará Ana Fani A.
Carlos (1994, p.77)[2]
para criticar o discurso ecológico:
(...) o discurso ecológico tem substituído o espaço concreto da prática
social do vivido, aquele de habitar no sentido amplo... Passa-se do vivido ao
abstrato para projetar essa abstração no nível do vivido. Neste sentido, a
natureza vira signo, e torna-se estratégica e política.
A sociedade capitalista
realiza um deslocamento discursivo de “matérias-primas e energia” para
“recursos naturais”. RODRIGUES (2005) não concorda com a idéia de “recursos
naturais”, pois caracteriza os elementos da natureza como mercadoria,
preferindo utilizar “riqueza natural”[3].
Temos vários equívocos
advindos deste ideário de Desenvolvimento Sustentável. Em vez de se falar em
classes sociais, se fala em “geração presente” e “geração futura”. A luta de
classes vira a luta por direitos individuais. Não dá pra pensar em geração
futura sem fazer com que a geração presente se aproprie das riquezas da
sociedade. Diz-se que a utilização de “novas tecnologias” irá proporcionar o
“desenvolvimento sustentável”, mas não se diz quais são essas “tecnologias
adequadas”.
Os Ecos-capitalistas
também perceberam que a “sustentabilidade” é um rentável nicho de mercado.
Concordo com RODRIGUES (2005, p.100), quando ela diz:
(...)
a aceitação do desenvolvimento sustentável implica impor regras de controle,
usar novas tecnologias, obter certificados de uso racional de recursos (ISOS),
de controle de resíduos e, sobretudo, permitir a continuidade de reprodução
ampliada do capital, conferindo-lhes legitimidade para a concorrência com
outras empresas “que não contribuem para a preservação do meio ambiente”, não
tem o certificado ambiental.
A idéia de Desenvolvimento
Sustentável é insustentável, nunca ocorrerá numa sociedade capitalista e o
indígena não precisa deste ideário porque isso já faz parte de sua existência.
Impossível no capitalismo se desenvolver sem destruir (mantendo as coisas).
As maiorias
dos movimentos ambientalistas estão equivocadas em sua crítica, mas muitos
deles possuem vínculos estreitos com o modo de produção capitalista, como
podemos ver em BLUWOL (2009, p.59-60):
É
fácil observar que grande parte dos movimentos ambientalistas não é contra o
modo capitalista de produção, e muitos são até parceiros, tendo apoio da
chamada iniciativa privada, ou seja, as empresas capitalistas. Isso se dá, pois
a principal luta deles é a conservação dos recursos naturais que servem de
matéria-prima para estas indústrias. Natureza, para estes movimentos e
indústrias, é apenas uma fornecedora de matéria-prima e, portanto, deve-se
conservá-la minimamente. (...) Esses movimentos podem ser chamados de
“Capitalismo verde”, e são, infelizmente, a esmagadora maioria dos movimentos
ditos “ambientalistas” ou “ecológicos”, ao menos dos que possuem acesso ao grande
público, principalmente no que diz respeito à veiculação de suas idéias nas
grandes mídias, com o apoio financeiro da iniciativa privada ou do próprio
governo estatal que, logicamente, também possui seus interesses capitalistas na
exploração de seu território e de seus habitantes.
Um dos grandes
questionamentos a serem colocados é de que o Desenvolvimento Sustentável e uma
relação sustentável entre Homem-Natureza só poderá se realizar em uma sociedade
que não seja capitalista. Temos de nos perguntar que tipo de sociedade tem de
ser construído para se atingir tal objetivo?
Na escola o
professor de geografia tem de levar o aluno a ter tolerância a outros conceitos
de natureza, fazendo compreender o conceito de natureza da sociedade
capitalista, para este poder criticar e poder superar o conceito e a sociedade
capitalista.
A raiz do
problema não é somente a dicotomia Homem e Natureza (até porque esta dicotomia
é realizada desde o “momento em que o homem se diferenciou da natureza ao ser
uma natureza que tomou consciência de si próprio”), mas a relação social, ou
seja, o modo de produção capitalista. A crítica tem de ser mais estrutural do
que ideológica. Esta passagem de CARVALHO (1986, p.48) explicita e diferencia a
crítica estrutural da crítica ideológico (principalmente daquelas alienadas):
(...) De um lado, uns questionam o próprio modo de
produção, responsabilizando-o pelo desastre, acenando com novos parâmetros para
os cálculos econômicos (que não sejam os do consumismo e acumulação), cobrando
dos homens uma nova concepção no trato com a natureza, isto é, um novo arranjo
econômico. De outro lado, vêm aqueles que propõem verdadeiras
"comunhões" classistas para despertar o "inconsciente
ecológico" que dormia no "bicho-homem" e, assim, todo mundo
ganha o seu quinhão de responsabilidade num processo secular de destruição de
um patrimônio que, para muitos, apenas significa sobrevivência e, para uns
poucos, supervivência.
Criar um novo
conceito de natureza significa criar uma nova sociedade, pois ao se mudar
sociedades, os pensamentos e os conceitos terão de ser modificados.
Os modismos de
“Desenvolvimento Sustentável” ou da Agenda 21 existem para despolitizar o
debate, estando elas ligadas à agenda política do Banco Mundial. Na Agenda 21
temos a idéia de que a “preservação e a conservação” dos recursos naturais
poderão provocar a “inclusão” social. Isto é uma falácia, pois uma “inclusão de
fato” somente ocorrerá com a extirpação do modo de produção capitalista.
Somente com o fim da sociedade capitalista poderemos
construir um conceito de natureza e homem realmente sustentáveis. Um conceito que
mais se coaduna com um tipo de mundo que queremos construir ou preservar.
[1] IPCC (Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), CDB (Convenção sobre Diversidade
Biológica, assinada, durante a ECO-92) e o IPBES (Painel Intergovernamental de Políticas Científicas sobre
Biodiversidade e Ecossistema).
[2] CARLOS ANA FANI, A.
O meio ambiente urbano e o discurso ecológico. Revista do Departamento de
Geografia, n. 8, USP/FFLCH, 1994.
[3] RODRIGUES (2005)
reproduz o pensamento da cientista Vandana Shiva, que diz que as riquezas
naturais não são contabilizadas na economia de uma maneira correta, pois só se
leva em consideração o preço e o valor de mercado, desconsiderando o valor em
si (o tempo de formação dos objetos naturais, sua importância ambiental-local,
etc).
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